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Hoje, de manhã, já sob forte sol, dei uma saída por ruas perto de onde moro em Copacabana. Minha intenção era abraçar cada um dos que, por modos diversos, me servem o ano inteiro em funções de valia para mim, ainda que socialmente tidas como funções humildes. “Tem certos dias que eu penso na minha gente/ e sinto assim todo o meu peito apertar/...Que vai em frente sem nem ter com quem contar/...É gente humilde...”, tantos cantaram esta música que minha memória reteve, e meu coração agasalhou. Que melhor dia para abraçar os meus amigos humildes, que o último do ano, para agradecer-lhes o quanto que, com carinho, me serviram, me ajudaram, ficaram solidários comigo?
Na saída de casa, abracei logo dois dos funcionários do prédio, com boa diferença de idade entre eles. Mas todos dois solícitos, prestantes. Vai chover, professor, como me chamam. Embrulhos pesados, professor, deixa eu carregar eles, me diz o outro. O sol está muito forte pro senhor sair agora.
Ao sair do prédio, abraço logo a jornaleira ou ao seu filho. Que luta a deles em tempos de internet? Que trabalho no dia a dia! Mas sempre com um bom dia e um sorriso de simpatia .
Ao atravessar a rua, num ponto de táxi, abracei hoje três deles, a quem já conheço bem: onde moram, a família que têm, as dificuldades da vida, a luta pelo taxímetro rodando, frustações que carregam, o cansaço, os perigos da profissão. Não vou a uma praia há anos, me contou um. Cinema? Já nem sei como é, confessa um outro. Meus filhos é que me dão força para continuar a minha luta, desabafa um terceiro.
Sigo por outra rua. Lá peço o meu último capuccino do ano. De tantos que tomei, servido por dois rapazes ou por duas moças. Gente muito boa. Educados, simpáticos, de bom humor, ainda que morando em comunidades. Converso muito com eles. Sei das dificuldades por que passam. O ambiente que criaram na casa é o melhor possível. Harmonia entre eles. Todos cearenses. Que alegria, sou meio cearense, pois meu pai era cearense. Sempre que podem vão visitar suas cidades nordestinas, economizando para tal.
Na mesma rua, entro no salão do que me corta o cabelo há anos e anos. Na verdade, passou com o tempo a me cortar mais a barba e o bigode... Sinal de que o tempo passou mesmo. Muito conversamos, mormente quando o salão está vazio. Chega a ficar com ciúmes, quando viaja, e eu tenho de ir com outro do mesmo salão. Como é importante saber da vida desta gente humilde .
Assim, por perto de onde moro, tenho esta gente humilde como amiga , amiga mesmo. Foi uma manhã muito feliz a minha de hoje. Abraços carinhosos, que falavam por si. Nem se precisava quase se falar. Com amigos não se dá isto? Os abraços não falam mais alto? Pela manhã que tive, o último dia do ano já valeu muito para mim.