Ruth de Aquino, editora da revista Época no Rio de Janeiro, concluiu sua resenha do filme “O curioso caso de Benjamin Button” (ed. de 26012009) com uma frase filosófica: “Tudo que começa acaba”.  Exceto Deus, eu diria. Aprendemos bem, nas aulas de catecismo, que Deus é eterno. Não teve começo e não terá fim.

Para os religiosos, Deus criou o homem, ao final de sua jornada de trabalho dos sete dias da criação.  Os belíssimos afrescos de Michaelangelo no teto da Capela Sistina, no Vaticano, registraram para sempre a figura de Deus transmitindo a Adão a fagulha de vida.

Para os agnósticos, foi o homem que criou Deus. A aceitar essa segunda hipótese, temos de admitir que, ao criar Deus, o homem O  poupou da principal contingência da  condição humana: tudo que começa tem fim.

Não escapa dessa certeza o protagonista da estranha história de Benjamin Button, no filme de David Fincher, que concorre aos Oscars de melhor filme e de melhor ator, para Brad Pitt.

Benjamin Button vive a vida ao contrário, nasce velho e, à medida que o tempo passa, vai-se rejuvenescendo, o que não o livra da morte, depois de ter voltado a ser um bebê de colo.

O que mais me impressionou no filme foram os encontros e os desencontros. Bem o disse o nosso grande Poetinha, Vinícius de  Moraes:  “ A vida é a arte do encontro, embora  haja tantos desencontros pela vida”. Para a maioria dos mortais, concertar os encontros é principalmente uma questão espacial: os encontrantes têm de estar na mesma latitude e longitude, num determinado momento.  Button, além de procurar dividir o mesmo espaço com sua amada, teve também de aguardar  que a cronologia de suas vidas lhes fosse favorável.

Ele nasceu em Nova Orleans,  no exato dia em que terminou a Primeira Guerra Mundial. Ao longo de sua vida, mais desencontrou-se que se encontrou com o seu grande amor . Quando ela era uma linda menina,  já afoita, ele, que conhecia sua avó, era um menino ancião, com todas as limitações e os  dramas da velhice. Quando ele se torna um magnífico jovem, a quem Brad Pitt empresta sua beleza e juventude, ela estava a caminho de se tornar uma anciã.

Mas houve um momento em que ambos se encontram em pleno vigor de suas vidas e se entregam a uma paixão sem limites.  Dessa epifania, nasce-lhes uma menina, cuja sobrevivência e bem-estar ele garante enquanto goza  do discernimento da idade adulta. Depois se afasta dela e da mãe, para que a menina pudesse ter um pai de verdade e não um coleguinha de jardim-de-infância.

Segundo Ruth de Aquino, o roteiro do filme aparentemente surgiu de uma citação de Mark Twain, que também levou Francis  Scott Fitzgerald  a escrever o conto de onde o roteirista, Eric Roth,  recolheu o título e a trama do filme. Para Mark Twain,  “A vida seria infinitamente mais feliz  se pudéssemos nascer aos 80 anos e gradualmente chegar aos 18”.  Talvez ele tivesse razão, se essa fosse a regra para todos. Pelo menos, poderíamos conciliar a maior vitalidade com a melhor sabedoria, que é a que se adquire com a experiência. Mas já que  não é assim que a natureza imprime o seu curso a todo ser vivente , só nos resta aprender a arte da vida, que é a arte do encontro. Salvador, BA, 30 de janeiro de 2009.

 

 

Categoria pai: Seção - Notícias