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O Seminário Internacional Fazendo Gênero 8: Corpo, Violência e Poder pretende dar seqüência ao projeto de encontros bianuais que se realizam tradicionalmente na UFSC há mais de uma década e que teve sua gênese em 1994, no Fazendo Gênero — Seminário de Estudos sobre a Mulher, ligado às áreas de Literatura. Com feição interdisciplinar e envolvendo, a partir daí, vários Centros, Departamentos, Programas de Pós-graduação, Núcleos de Pesquisa da UFSC e de outras universidades regionais e nacionais, ganhou dimensão internacional em 2000 e vem se consolidando como importante evento na área de estudos de gênero, tanto na academia quanto em relação a outras organizações e movimentos feministas.

A retomada dos temas corpo, violência e poder, que não são novos nos estudos feministas e de gênero, deve-se à especificidade das conjunturas nacional e internacional acerca das lutas a favor da descriminalização do aborto (no Brasil, no Uruguai, na Argentina, em Portugal); à politização do tema da violência conjugal, no caso do Brasil propiciada pela Lei Maria da Penha; aos processos de reconhecimento judicial de parcerias homossexuais; ao  acirramento ou maior visibilidade da homofobia; aos dilemas éticos envolvidos nas decisões médicas e judiciais relacionadas às novas tecnologias de reprodução; aos paradoxos das atuais diásporas internacionais envolvendo as questões de gênero; e à feminização da pobreza, entre tantos outros aspectos que estas questões têm suscitado na atualidade.

Ainda que o Seminário tenha estas temáticas norteadoras, a estrutura de Simpósios Temáticos permite que outros temas tenham seu espaço garantido, como ocorreu nos encontros anteriores.

O Seminário Internacional Fazendo Gênero 8: Corpo, Violência e Poder buscará continuar possibilitando a diversidade de abordagens teóricas e metodológicas, no sentido de imprimir ao evento não só um caráter inter e trans-disciplinar, mas também uma orientação epistemológica heterodoxa e democrática, extremamente importante para a vitalidade dos estudos neste campo.

 

 

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Império
O dono do mundo

Napoleão Bonaparte está no auge e nada parece segurar
sua sede de poder – exceto uma certa Marinha inglesa

Veja também

Quadro: Chegaram os dias de glória

O homem mais poderoso do mundo ainda fumega de raiva quando se lembra de um dos menos poderosos, no momento. O único que me enganou, costuma dizer Napoleão Bonaparte, autoproclamado imperador dos franceses, que tem a Europa quase inteira a seus pequenos e vitoriosos pés, mas não conseguiu impedir a fuga do príncipe João, o regente português recém-chegado ao Rio de Janeiro. Para Napoleão, na prática, tanto faz: seu Exército tomou Portugal quase num piscar de olhos – menos de quinze dias – e um de seus fiéis generais, Jean-Andoche Junot, governa o país como preposto do poder imperial francês. O ardil dos portugueses, no entanto, pode sinalizar um ponto de inflexão na maré napoleônica. As coisas não vão bem na Espanha, que se aliou aos franceses contra Portugal mas agora dá sinais de resistência, tanto na realeza quanto entre a população comum. Os ingleses continuam a ser um osso duríssimo, se não impossível, de roer: por mais vitórias que Napoleão tenha em terra, eles são os donos dos mares, como se viu com a proteção dada à corte portuguesa em fuga. É arriscado fazer previsões sobre os resultados da guerra que eclode cada hora num lugar da Europa, com conseqüências para o mundo inteiro, mas os precedentes permitem sustentar que os ingleses jamais vão ceder – nem, provavelmente, perder para Napoleão.

Parece exagero especular sobre futuros tropeços justamente no momento em que esse homem, excepcional por qualquer padrão que se julgue, atinge o ápice do poder. Para chegarmos até esse campo pantanoso da projeção de acontecimentos futuros com base no presente, vale relembrar os principais capítulos da carreira meteórica do hoje imperador, construída sobre o caos sanguinolento e autodestrutivo em que havia desembocado a grande revolução desencadeada na França em 1789. Nascido na Ilha da Córsega e formado militar nos estertores da monarquia, Napoleão Bonaparte foi promovido a general aos 24 anos, conquistou a Itália aos 27 e o Egito aos 29. Aos 30, embicou para o poder absoluto como primeiro-cônsul. Coroou-se imperador da França e rei da Itália aos 35. Vai completar 39 anos em agosto próximo. Seus exércitos são hoje invencíveis. Ele tem sob seus desígnios um vasto território que vai do Mediterrâneo ao Báltico; do cálido litoral atlântico de Portugal às águas geladas do Rio Nemen, na fronteira da Polônia – agora chamada de Grão-Ducado de Varsóvia – com a Rússia (veja mapa). Transformou em reis três de seus irmãos: José em Nápoles, Luís na Holanda e Jerônimo na Vestfália. Dois outros reis, da Baviera e da Saxônia, de sangue azul original, devem seu trono a ele (estes integram a coligação de estados alemães inventada por Napoleão com o nome de Confederação do Reno).

A grande reorganização do poder na Europa aconteceu em questão de anos e se acelerou depois do tratado de Tilsit, firmado no ano passado entre Napoleão e Alexandre I, o czar da Rússia. O tratado foi assinado a bordo de uma balsa luxuosíssima, enfeitada com águias douradas que simbolizam os dois impérios e mandada construir por Napoleão especialmente para encantar o jovem e influenciável Alexandre (Eu odeio os ingleses tanto quanto o senhor, disse o czar no primeiro encontro. Nesse caso, a paz já está feita, respondeu Napoleão). Alexandre levou a Finlândia em rédeas soltas em relação ao Império Otomano. O imperador francês, o resto. O tratado é o mais próximo que Napoleão já chegou de concretizar sua obsessão, patentemente impossível, de unir a Europa toda num só estado, como um Carlos Magno moderno, movido pela força da espada e pelo poder das idéias.

São essas, justamente, que espelham as enormes contradições que, tal como as linhas de um destino praticamente sem precedentes na história mundial, pesam sobre esse homem. Napoleão é visto, simultaneamente, como herói e vilão dos ideais de liberdade e democracia que há algumas décadas agitam o mundo. Recebido como libertador por povos submetidos a monarcas despóticos, ele recorre aos mesmos instrumentos de repressão dos velhos regimes. Seu império é construído sobre uma montanha de corpos – incontáveis, mas calculados em algumas centenas de milhares. O melhor retrato das reviravoltas políticas que o transformaram de republicano militante em imperador com cetro e coroa (pela graça de Deus e aprovado em plebiscito, já que estamos falando em contradições) foi feito talvez por Ludwig van Beethoven. O talentoso compositor a serviço do imperador da Áustria dedicou sua terceira e revolucionária – musicalmente – sinfonia, a Heróica, a Napoleão. Decepcionado quando ele se coroou imperador, há quatro anos, Beethoven rebatizou-a de Sinfonia heróica, composta para celebrar a memória de um grande homem, como se seu inspirador já estivesse morto. Para justificar ideologicamente a proclamação do império, Napoleão praticou um dos maiores atos de contorcionismo conceitual de todos os tempos: alegou que só assim seria impossível restaurar a monarquia com a linhagem deposta dos Bourbon. Os franceses, exauridos pela instabilidade pós-revolucionária e embriagados pela retórica de seu comandante, aprovaram.

Napoleão tem estatura média, mas parece menor porque vive cercado pelos grandalhões de sua guarda de honra, uma tropa de elite composta de militares com 1,80 metro de altura, pela medida francesa. Memória, inteligência e resistência física são prodigiosas. Come em vinte minutos e dorme pouquíssimo. Depois da Batalha de Austerlitz, em dezembro de 1805, escreveu a Josefina, a mulher por quem tem paixão quase obsessiva: Bati o Exército russo e o austríaco. Fatiguei-me um pouco, acampei oito dias ao ar livre, em noites bastante frescas. Deito-me esta noite no castelo do príncipe de Kaunitz, onde vou dormir duas ou três horas. Goste-se ou não dele, é forçoso admitir que é um dos maiores comandantes militares de todos os tempos – ou o maior, como reconhece seu inimigo mais constante, o britânico Arthur Wellesley. Gênio tático e estratégico, não é exatamente um inovador, embora tenha introduzido uma mortífera novidade, as chamadas baterias de artilharia, uma força móvel que surpreende os inimigos. Tudo o que faz em campo de batalha já foi feito antes – mas ele faz como ninguém. É brilhante para arengar a tropa. Soldados! Estais nus e mal alimentados, disse aos camaradas que enfrentavam a dura travessia dos Alpes na campanha da Itália. Quero conduzir-vos às planícies mais férteis do mundo. Ricas províncias, grandes cidades cair-vos-ão nas mãos. Ali encontrareis honra, glória e riqueza. Em duas semanas, tudo se cumpriu.

Nas campanhas militares iniciais, como as da Itália e do Egito, Napoleão criou um núcleo de comandados fiéis e corajosos que o acompanham em sua escalada desde então. Deles, exige tudo – inclusive sorte. Mas também retribui. Um simples granadeiro pode chegar a general, herói ou príncipe. Catorze generais, todos de origem humilde, foram promovidos a marechais da França quando Napoleão proclamou o império. Ao louvável sistema de meritocracia que usa com os generais, contrapõe-se a liberalidade com que distribui reinos aos irmãos e grão-ducados às irmãs. O nepotismo é produto tanto do desejo de fundar uma dinastia própria para perpetuar sua obra quanto da força dos laços de sangue que trouxe da bela e selvagem Córsega. A família era pobre, mas orgulhosa. Tinha – ou produziu por conhecidos métodos corsos – um título da pequena nobreza italiana, usado para matricular o menino de apenas 9 anos na escola militar de Brienne, onde o sotaque e o nome esquisito (ainda Napoleone di Buonaparte) o tornaram alvo de humilhações. Quis sair. Estou cansado de suportar a indigência e de ver sorrir insolentes colegiais, escreveu à família. Não temos dinheiro; é preciso ficar, respondeu, realista, o pai. Ele se formou em 1785, como segundo-tenente de artilharia. Caprichoso, altivo, extremamente disposto ao egoísmo, falando pouco, enérgico em suas respostas, pronto e severo em suas réplicas. Ambicioso e aspirante a tudo, dizia o boletim de avaliação. Tinha 16 anos. Ele, a França, a Europa e, por extensão, até o nosso distante canto do Novo Mundo estavam prestes a passar por mudanças telúricas.

Nunca a expressão o homem certo no lugar certo se aplicou tanto quanto no caso de Napoleão. A revolução acabou com a velha ordem e começou a devorar os próprios filhos. O jovem Napoleão conseguiu sair do furioso olho do furacão e, ao mesmo tempo, destacar-se em batalhas contra as forças das monarquias ameaçadas. Foi para Paris, onde conheceu Josefina de Beauharnais, uma viúva de 32 anos, olhos azul-escuros e um passado quase negro – era amante de um aristocrata convertido, como ela, à causa revolucionária. Napoleão apaixonou-se completamente. Josefina trocou de cama e de destino. Acordo cheio de ti. Teu retrato e a inebriante noite de ontem não permitiram repouso a meus sentidos. Uma chama me queima, um milhão de beijos, escreveu ele. Casam-se e ele parte para conquistar os territórios italianos que pertenciam à Áustria e ao papa (mas foi outro general que, um ano depois, tomou Roma e prendeu Pio VI, morto de doença no humilhante cativeiro). Paralelamente às conquistas militares, Napoleão introduziu na França reformas de um alcance difícil de descrever: educação universitária pública, novo sistema de impostos e de estradas, uma instituição que poderia ser descrita como um banco central e o Código Civil, que normatiza o funcionamento da sociedade e os direitos e deveres do cidadão, chamado – o que mais? – de Código Napoleônico. A novidade deste ano é o código criminal, que estabelece as regras dos processos na Justiça e novidades como o direito de todo acusado a um advogado. Fez uma concordata com a Igreja Católica – proibida durante a revolução – e reconheceu a religião protestante. Agora, está para sair o reconhecimento da religião judaica. Muitas das mesmas liberdades civis são estendidas aos países conquistados pela França.

Apesar do momento de glória que vive, no próprio poder conquistado depois de Tilsit, no ano passado, podem estar as sementes da destruição do imperador. Com a Europa sob seu controle, ele se sentiu livre para impor o bloqueio continental à Inglaterra e ameaçar Portugal, redundando na fuga da família real e na parte que nos cabe nessa história. O bloqueio é uma das maiores tolices que um governante pode cometer: contraria os interesses dos que dependem do comércio para viver e, portanto, uma das forças motrizes da mão invisível do mercado, como definiu Adam Smith, o pensador escocês falecido há menos de duas décadas, cujo legado ainda há de ser reconhecido. Boicotar uma potência marítima – e comercial – como a Inglaterra é comprar uma guerra sem fim. Brigar com o papa, como está fazendo com Pio VII, também não é boa idéia. O papa tem poucos canhões, mas continua a exercer autoridade moral sobre o mundo católico. O rei da Prússia e o imperador da Áustria – agora chamado de Francisco I, depois de ser obrigado a engolir a dissolução do legendário Sacro Império Romano – assinaram a paz, mas certamente não engoliram a humilhação. Brigar com um Habsburgo como Francisco, descendente de uma dinastia que chegou ao poder no ano 1020, é quase tão ruim quanto confrontar o papa. Quando países inteiros sentem sua existência nacional ameaçada, como Portugal e agora a Espanha, podem se rebelar, ainda que diante de um poderio militar infinitamente superior. Muito jovem, quando o nacionalismo na Córsega inflamava seu ressentimento contra os franceses que ocupavam a ilha, Napoleão escreveu em seu diário: Ver minha pátria neste estado, sem poder socorrê-la, é motivo suficiente para fugir de uma vida em que devo louvar aqueles a quem tenho ódio. Seu maior erro é não compreender que se transformou em um daqueles a quem muita gente tem ódio.

 

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Que lugar é este aonde acabamos de chegar, devem ter pensado os milhares de portugueses que desembarcaram no Rio de Janeiro na tarde ensolarada de 8 de março de 1808, desde já uma data histórica. Para começar, é um país, mesmo que em formação e ainda chamado de colônia – esclarecimento importante, visto que, com a chegada da família real, deram de falar que vivemos aqui numa massa amorfa e desconjuntada, como se não tivéssemos nos dado conta até agora de quem somos. Nem Nova Lusitânia nem América Portuguesa, como ainda querem alguns, o nome desta nação em formação é Brasil, e ponto final. Habitado por 3 milhões de pessoas – atenção, brasileiros, não brasilianos, como preferem alguns –, é um lugar de proporções tão vastas que custa à mente européia, e às locais também, imaginar até onde chegam suas fronteiras e à lógica aceitar que continuará na posição subalterna de hoje. A transferência do governo português para cá acelera, inevitavelmente, a dinâmica em direção a um futuro independente. As primeiras medidas tomadas por dom João, o príncipe regente e futuro rei – ou simplesmente João, para manter os padrões de informalidade daqui –, foram positivas. A abertura ao comércio, decretada durante a escala da família real na Bahia, é apenas o primeiro e incipiente passo para que o Brasil encontre seu lugar na ordem econômica internacional. Outras deficiências escandalosas deverão ser supridas em breve – é inacreditável, por exemplo, que aqui não exista ensino superior nem se possam publicar livros. Espera-se que a criação de um aparato de estado à altura da nova posição do Brasil como reino alternativo redunde em eficiência e progresso, não em excesso de cargos públicos e outras mordomias, tão caras dos dois lados do Atlântico.

O mundo está fervilhando de idéias que podem inspirar o Brasil. As duas grandes potências européias, França e Inglaterra, apesar da guerra, oferecem ambas modelos políticos instrutivos. Embora Napoleão Bonaparte tenha traído as origens ao se proclamar imperador, a transformação conceitual que produziu na França a Declaração dos Direitos do Homem veio para ficar. A Inglaterra não tem revolução nem Constituição escrita, mas o rei se sujeita ao Parlamento, como deve ser. Na jovem república dos Estados Unidos, vigora o princípio simplesmente transformador de que todos os homens nascem livres e iguais. A economia também está no início de importantes transformações. Avanços tecnológicos promovidos pelos britânicos e por seus irmãos rebeldes, os americanos, tornam possível a produção de bens de consumo em quantidades difíceis de conceber pelos padrões vigentes aqui. Por que uma mulher teria mais do que os dois ou três vestidos necessários para se apresentar em sociedade? A resposta, provavelmente, é porque ela pode. Inserir o Brasil numa economia que funcionará em escala global é obrigatório. Além de liberar o comércio, a chegada da corte portuguesa também enterra o decreto real de 1785, pelo qual se ordenava que, à exceção da indústria têxtil, todas as fábricas em território brasileiro deviam ser extintas e abolidas. A anomalia trazia a assinatura de Maria I, a rainha afastada por insanidade, que chegou ao Rio de Janeiro com o resto da família real.


Um país com liberdade para produzir e comercializar, regido por leis – por que não uma Constituição? –, integrado por cidadãos livres, donos de seu trabalho e de suas opiniões, sem a ignomínia da escravidão nem a injustiça do domínio colonial. O Brasil merece isso tudo, embora não se espere que a transferência do governo português produza as mudanças por passe de mágica. João, tantas vezes criticado como um príncipe hesitante, pode ser mais esperto do que se imagina. Talvez não demore a perceber que a separação entre Brasil e Portugal é inevitável, mas não precisa ser litigiosa. Ainda é cedo para dizer se haverá uma transição pacífica para a independência, como parece estar nas raízes brasileiras, ou um levante em armas, como já aconteceu nas duas ex-colônias americanas hoje independentes – os Estados Unidos e o Haiti. Mas já dá para prever que o alcance histórico da chegada da família real é um assunto que vai continuar a ser discutido pelos próximos 100, quem sabe até 200 anos.

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O projeto tem por objetivo ajudar na prevenção a ocorrência de novos atos de corrupção e a conseqüente diminuição dos processos extrajudiciais e judiciais, por meio da educação das gerações futuras, estímulo a denúncias populares e a efetiva punição de corruptos e corruptores. O projeto visa atacar dois pontos fundamentais:
  • 1º- acabar com a impunidade, ou seja, buscar a efetiva punição dos corruptos e dos corruptores, por meio de um canal real para o oferecimento de denúncias, e, o principal;
  • 2º- educar e estimular as novas gerações, mediante a construção, em longo prazo, de um Brasil mais justo e sério, destacando-se o papel fundamental de nossas próprias condutas diárias a partir do seguinte principio, é preciso dar o exemplo. O primeiro passo para consecução do projeto está envolvendo a promoção, junto ao Ministério Público Brasileiro, de uma valoração especial das atribuições constitucionais da Instituição, estimulando o desempenho de atividades extrajudiciais. Evidente, como nada se constrói sozinho, é preciso envolver outras instituições, empresas e pessoas a se engajarem num projeto de longo prazo que enrede a sociedade em uma campanha de estímulo à ética e a honestidade dos cidadãos.
  • http:www.oquevocetemavercomacorrupcao.com
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A educação existencial

 
Carta Escola, ed. 25

A relação que tivemos com os professores e aquilo que com eles aprendemos nos moldam e determinam nossos sonhos e aspirações

Muita paciência e dedicação ao outro. Saber caminhar no ritmo do outro. Estes são os talentos que mais admiro nos professores que trabalham com crianças e adolescentes. Talentos que não são propriamente os meus. E dos quais, aparentemente nós, docentes universitários, estamos dispensados.

Há uma expectativa comum de que quando um jovem entra para a universidade, seu perfil de estudante e de pessoa já esteja consolidado pela formação anterior. Uma tarefa que se considera da responsabilidade da família e da escola.

Espera-se que esses jovens, cuja experiência que até então era a de receberem – a atenção, o empenho, a informação, a formação –, mudem de posição. Espera-se que eles transitem da condição de receptores para a condição de agentes de seu próprio crescimento e de sua própria aprendizagem. Em outras palavras, há uma crença geral de que quando um jovem entra para a universidade ele já aprendeu a ser autônomo, a tomar iniciativas, a ter responsabilidade.

A universidade está numa profunda e inexorável dependência do que acontece na escola, quer dizer, da formação que os jovens tiveram nela. A escola também depende da universidade, uma vez que é dela que emergem seus profissionais, mas a dependência é de outra natureza. Especialmente, porque, a meu ver, o Ensino Superior apenas complementa o que o Ensino Fundamental e Médio começaram.

Sabemos o quanto todo começo, toda origem é importante (o começo de um país, o começo de uma amizade, o começo de uma idéia, o instante do nascimento de uma perspectiva para a vida). Todo começo é um depositário das nossas heranças e bagagens. Por isso marca de forma indelével o futuro. Não há ponto de chegada que não tenha tido um específico ponto de partida.

A escola fundamental funciona como um começo. Ela é uma estrutura de origem e o que acontece nela se entranha na condição existencial dos que por ela passaram e nela viveram. O tipo de vínculo que crianças e adolescentes criam com a escola é incomparavelmente mais profundo do que aqueles que os jovens formam com a universidade. As crianças não passam pela escola. Vivem nela. Recebem dela marcas tão fundas quanto as que recebem de suas famílias. A escola torna-se um traço do seu caráter pessoal.

Esse poder da escola, certamente tem suas bases nos métodos e sistemas educacionais e administrativos que a constituem e que elas desenvolvem. Mas não são sistemas e métodos o eixo de tal poder. A alma da escola são as pessoas que nela trabalham. Em especial aqueles que estão na relação mais cotidiana e imediata com os alunos, os professores.

Quem de nós não teve seu destino pessoal e profissional inspirado por um professor? Pela simpatia, pelo carinho, ou mesmo pelo medo e aversão que tivemos por alguns deles?

Eu tinha uns 11 anos quando fiquei sabendo, numa aula de Português, que Rui Barbosa não repetia palavras num mesmo texto, mas buscava sinônimos para elas. Chicote, açoite, chibata, azorrague, chiqueirá... E foi o encantamento da minha professora com o fato que me encantou. Até hoje escrevo com um dicionário ao lado, tentando seguir o exemplo do escritor.

A professora de Matemática dos meus primeiros anos escolares nos ensinava e falava da matéria com um fastio secular. Cálculos são penosos para mim, até hoje, e não vejo a hora de me livrar deles quando tenho alguma conta para fazer.

Entrei na escola sabendo ler e escrever e meus colegas de turma ainda precisavam ser alfabetizados. A professora percebeu que seria um tormento para mim voltar para a cartilha e, sabiamente, me dava como tarefa ajudar meus companheiros no caminho das letras. Não teriam sido o cuidado e a sensibilidade dela as sementes da minha profissão?

A qualidade do exemplo
A relação que tivemos com nossos professores e aquilo que com eles aprendemos, atenta ou distraidamente, molda nosso ser. Determina nossos sonhos e aspirações, tanto quanto nossos interesses e comportamentos mais corriqueiros. São nossos primeiros modelos e, assim como nossos pais, nos aparecem como aquelas pessoas que gostaríamos (ou não) de ser.  

Numa universidade, os professores também são modelos e inspiração para os alunos, pela condição genérica de que pessoas sempre são exemplos para outras. Mas na escola essa relação é mais determinante. Em comparação com os universitários, que bagagem e experiências as crianças e os adolescentes têm para poder acreditar ou duvidar, para aceitar ou recusar o que lhes é oferecido? Que história têm eles, a não ser aquela que ainda estão forjando junto aos seus familiares, mas também junto aos seus professores?

Ao contrário de todas as demais criaturas vivas, com as quais compartilhamos a vida, não nascemos prontos. Abelhas já nascem sabendo ser abelhas, mas os homens não nascem sabendo ser humanos. Ser um homem e ser o indivíduo exclusivo que cada um de nós é, está para ser aprendido e construído.

As crianças e os adolescentes estão aprendendo a ser pessoas, obviamente, com as pessoas com as quais convivem. Daí que a qualidade do exemplo que pudermos oferecer a eles é mais do que fundamental. Que tipo de pessoas estamos sendo? Como estamos nos ocupando do mundo e dos outros com os quais convivemos? Como cuidamos de nós mesmos? Como tratamos o viver? Que modelo de homem e mundo queremos e realizamos através das nossas palavras e ações?

Respostas a essas perguntas o educador tem de dar tendo muita clareza sobre o mundo em que vive: sua feição, tendências, seus entraves e aberturas. A educação acontece instalada num mundo, atravessada e provocada pelos valores, pelos modos de ser e pelas questões nele vigentes.

Por exemplo, vivemos numa sociedade de massas, para a qual, grosso modo, o mundo é um grande mercado onde tudo se compra e tudo se vende. Consumo, portanto, e não compromisso ou responsabilidade é, para ela, o comportamento ideal para se lidar com a vida e cuidar das coisas do mundo. Nela, o homem é criado à imagem e semelhança do consumo. Ser humano é ser consumidor. Viver é consumir.

Enquanto consumidores, os homens se relacionam com o mundo no modo de tirar proveito dele, usá-lo e explorá-lo para seu prazer e saciedade. A grande implicação deste modelo de homem e de comportamento não é apenas a devastação do território do mundo que promove, a exemplo do aquecimento global, que hoje se apresenta como a mais séria ameaça à nossa sobrevivência. A grande implicação é que esse modelo de homem e de ação no mundo atinge de forma arrasadora o coração da nossa própria condição humana que, como bem expressa Martin Heidegger, é a de sermos “cuidadores” ou “pastores do ser”.

Cuidar, arcar com a responsabilidade pelo mundo ou para com a existência, em termos gerais, é o modo de ser essencial de nossa humanidade. Restaurá-lo e fortalecê-lo me parecem ser os principais desafios da educação atual.
Permeando a educação formal está, então, a construção de uma ética fundamental e o desenvolvimento de uma educação existencial originária.

Já ouvi muitos educadores perguntarem sobre “que mundo estamos deixando para nossas crianças”. E ouvi outros perguntarem sobre “que crianças estamos deixando para o mundo”. Ambas inquietações se complementam. E ambas só podem ser respondidas, não com teorias, mas com exemplos. O mundo será o que fazemos dele agora. E nossas crianças seguirão o exemplo de nossas ações atuais.
Portanto, se quisermos ser educadores, temos de tomar uma decisão sobre uma questão fundamental: “Se amamos o mundo o bastante para assumirmos a responsabilidade por ele...”

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Nasci no remoto ano de 1945, em São Lourenço, encantadora estação de águas no sul de Minas, aonde Manuel Bandeira e outros doentes iam veranear em busca dos bons ares e águas minerais, que lhes pudessem restituir a saúde.

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