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Ainda sob o tremendo impacto negativo do consumo pelo fogo do acervo científico do Museu Nacional, volto a expressar alguma experiência que tenho diante dessa tragédia.

Quando eu ainda era estudante de História Natural no Rio (nos primeiros anos da década de 1960, portanto há quase 60 anos), visitei com alguma frequência o Museu, não a parte de exposição, mas as coleções científicas, inclusive com colegas lá fazendo estágio como bolsistas. Mais tarde, já como pesquisador, também tive boa interação com pesquisadores de lá, incluindo dr. João Moojen (pequenos mamíferos), dr. Coimbra Filho (primatas), dr. José Cândido de Mello Carvalho (insetos), entre outros.

Em 1989 fiz um pós-doutorado no Museu de História Natural da Smithsonian Institution, em Washington, EE. UU., e vi como essas coleções científicas são cuidadosamente guardadas, por curadores especializados, em prédios próprios. Há inúmeros detalhes de instalação que são obedecidos, e só para citar um exemplo, os interruptores de luz não são como esses comuns que conhecemos em todos os lugares. Esses podem eliminar pequena e imperceptível centelha, a qual pode causar incêndios. Portanto, tudo é minuciosamente detalhado para segurança, incluindo prevenção de potencial incêndio. Outro exemplo, no Museu onde também trabalhei na Califórnia, as coleções estão guardadas em prédio construído à prova de terremoto, uma vez que tremores de terra podem ocorrer naquela região, e na sua maior parte são imprevisíveis.

Desde minha época de estudante, ouço dos pesquisadores do Museu Nacional o desejo de mudar o acervo científico para prédio seguro, pois o prédio do Museu Nacional foi construído como residência, talvez mais adequado para ser um Museu Histórico, mas nunca para conter um acervo científico, em razão de sua vulnerabilidade.

Aliás, segundo historiadores, esse palácio foi construído para servir de residência para um milionário português, que fez fortuna com plantação de café e tráfico de escravos. Na época, era a mais bela casa do Rio de Janeiro. Dom João VI, quando chegou no Brasil, gostou da casa e quis fazer dela a residência da família real. Aí se deu o conhecido recurso do “toma-lá-dá-cá”. O português doou seu palácio para o rei de Portugal e recebeu em troca uma nova e bela residência em outro local, mais diversas condecorações, abrindo-lhe o trânsito na corte, e continuou a ganhar dinheiro comercializando escravos.

Depois da Independência, o Palácio foi ampliado e remodelado para ser a residência imperial. Depois da república proclamada, foi transformado em Museu Nacional, exibindo obras de arte, mobília e objetos históricos, uma bela biblioteca etc. E esse museu passou a receber o acervo científico, com espécimens de nossas fauna e flora e também minerais.

Aliás, diga-se que há uma certa raiz cultural nessa história. Os portugueses nunca foram bons nessa questão científica. A maior evidência disso é que as grandes expedições em busca de documentar nossa biodiversidade foram feitas por expedições de outros europeus, que não portugueses. Essa evidência se dá, por exemplo, durante a ocupação holandesa. O fato é que, ainda hoje, grande parte do acervo científico brasileiro está depositada em museus europeus, menos em Portugal, porque foram pesquisadores europeus não-portugueses que fizeram os primeiros levantamentos de flora e fauna em nosso território. E a carência de estrutura para guardar nosso acervo científico vem perdurando até os dias atuais. Exemplo disso é o acervo de plantas do Cerrado e da Amazônia que foram coletadas, classificadas taxonomicamente e depositadas em herbários do exterior, como em Nova York, em Londres (Kew Gardens) e outros lugares. Isso mostra o descaso ou a ignorância de nossos governantes com relação à importância desse assunto.

Há vários aspectos relevantes a considerar sobre isso.

O Brasil é um território imenso, com biomas diferentes como Amazônia, Cerrado, Caatinga, Mata Atlântica, Pantanal, Campos Sulinos e outros. Deveria assumir seu papel global em defesa desse patrimônio natural da biodiversidade.
Embora tenha assinado e se comprometido com Tratados e Convenções Internacionais, como é o caso da Convenção da Diversidade Biológica (CDB), o país continuou a menosprezar esse compromisso. A CDB diz que a primeira responsabilidade do signatário é conhecer a sua biodiversidade, isto é, inventariar a diversidade biológica que existe no país. E os museus têm papel importante em guardar esse acervo inventariado cientificamente.
Além da importância científica e ética, o conhecimento de nosso patrimônio natural é importante também economicamente. Mais de 70% dos medicamentos que existem hoje no mercado vêm da natureza, assim como os cosméticos. É por isso que existe a tão malfadada “pirataria da biodiversidade”. Enfim, o país continua a ignorar o inventário de sua riqueza natural como continua a ignorar o enorme potencial que a biodiversidade pode oferecer no campo da biotecnologia.
E ao invés de incentivar a pesquisa, proteger o acervo científico, vai pelo caminho de criar dificuldades para a pesquisa científica, a título de proteger a biodiversidade. É o caso da Lei 13.123 de 2015 que regulamenta o uso da biodiversidade, que trouxe algum alívio para os pesquisadores, com a revogação da muito mais restritiva Medida Provisória 2.186, efetiva desde 2001 a 2015.
Sobre essa questão do valor de um acervo guardado, lembro-me de que uma vez, em viagem à Turquia, visitei a cidade de Éfeso, que teve seu auge cultural na época de Cristo. E lá havia uma imensa biblioteca, que fora destruída por um incêndio, cujas ruínas eu visitei. Naquela biblioteca havia um acervo de pergaminhos com escritos da época. E eram documentos únicos, porque não havia cópias, ainda não havia imprensa. E tudo foi destruído pelo fogo, privando todos de conhecer o que aqueles pergaminhos continham.

É assim que ocorre com a destruição de nossa biodiversidade, que pode se acabar sem sequer ser conhecida. Uma espécie, quando é extinta, perde aquela codificação genética própria; é extinta para sempre.

Enfim, são essas e outras coisas dolorosas e angustiantes que ora me ocorrem, quando o desmazelo e a ignorância levam a reduzir a cinzas o nosso precioso patrimônio natural.

Prof. Cleber J.R. Alho, Ph.D.
Conservação da Biodiversidade

 

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Nasci no remoto ano de 1945, em São Lourenço, encantadora estação de águas no sul de Minas, aonde Manuel Bandeira e outros doentes iam veranear em busca dos bons ares e águas minerais, que lhes pudessem restituir a saúde.

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