
Praticamente sem aumentar os custos, dona Vicky conseguiu que estudantes do interior obtivessem desempenho melhor em testes do que os citadinos
Vicky Colbert passou pelo Brasil e não conseguiu me encontrar. Pois não é que na semana seguinte descobri que estávamos no mesmo hotel em Doha (Catar)? Eu era parte da plateia de um monumental evento sobre ensino e inovação. Ela estava lá para receber um prêmio. Aliás, há dois anos nos encontramos na Clinton Global Initiative, em que ela ia receber outro prêmio. São muitos! Para o Banco Mundial, suas escolas estão entre as três maiores inovações no ensino, pois países em desenvolvimento podem reproduzi-las em grande escala.
Dona Vicky, uma socióloga colombiana, é a mentora das Escuelas Nuevas em seu país. O interior da Colômbia é, pelo menos, tão atrasado e pobre como o nosso. Portanto, não espanta que a qualidade da educação fosse pior do que a urbana. De fato, é assim em todos os países. Mas na Colômbia mudou. Após a implantação da Escuela Nueva na zona rural, caíram a repetência e a reprovação. Aumentaram também os escores nos testes. Os resultados passaram a ser melhores que os das urbanas (e, junto com Cuba, os mais elevados na América Latina).
Note-se que em grande parte as escolas rurais são unidocentes, isto é, são escolas muito pequenas, nas quais um professor ensina simultaneamente em várias séries iniciais. Somam-se o atraso e o isolamento rural ao desafio extra de lidar com todas as séries em uma mesma sala e com um único professor. Praticamente sem aumentar os custos, dona Vicky conseguiu que seus caipiras obtivessem mais pontuação nos testes do que os citadinos. A inovação se alastrou. Hoje está em 35 países e matricula 5 milhões de alunos. No Norte e Nordeste do Brasil, há 4 000 escolas que adotaram o método, mas têm pouca divulgação e sabemos pouco dos resultados. O que fez dona Vicky para obter tão retumbante sucesso? Onde está a diferença, diante de tantas ideias redentoras que circulam por aí? Na verdade, o principal segredo é pôr em prática uma solução integrada. São várias medidas e inovações que se juntam para fazer a diferença. De fato, não se reforma a educação com uma única providência miraculosa. É o conjunto que origina massa crítica. O mérito de dona Vicky e de sua equipe foi refinar essas providências e montar a máquina administrativa que fez tudo funcionar.
Os materiais escolares foram especialmente desenhados para o programa e se baseiam nos princípios da educação ativa. Os professores são cuidadosamente preparados para usá-los com competência, além de receberem acompanhamento permanente do projeto. Há encontros frequentes, a fim de discutir práticas de ensino. A ampla participação da comunidade requer estratégias apropriadas, para que ela se aproxime da escola, apoie suas propostas e se incorpore aos projetos práticos dos alunos. Sem fórmulas mágicas, é um feijão com arroz bem temperado.
Porém, há diferenças. Uma delas está na ênfase na cooperação entre os estudantes e, também, na integração com a comunidade. Outra diferença são as salas de aula e as atividades ao ar livre, em que se combinam os assuntos escolares com aplicações práticas. A ênfase na leitura e na compreensão é um foco central do aprendizado. Talvez mais surpreendente, os livros e guias são autoinstrucionais, ou seja, cada aluno estuda por conta própria, caminha em seu ritmo e toma decisões. Nas atividades de leitura, os estudantes avaliam o desempenho uns dos outros. Em grande medida, tais soluções reduzem as clássicas aulas expositivas, liberando o professor para atender os alunos mais necessitados de apoio individualizado.
Agora que as escolas rurais têm uma fórmula consolidada, dona Vicky está adaptando o modelo para as urbanas. Ainda não foi possível avaliar os resultados, mas, segundo ela, parecem promissores. Uma segunda iniciativa é estimular a participação das empresas. Ao longo do tempo, observou-se que as mudanças políticas trazem instabilidade e perdas às escolas (não é só na Escuela Nueva!). O novo prefeito tem ideias diferentes. Daí a procura de parceiros nas empresas privadas que queiram ajudar as escolas públicas, pois podem amortecer a volatilidade trazida pela politicagem. Como as empresas colombianas e brasileiras têm grande protagonismo na educação pública, dona Vicky se aproxima do nosso país para prosseguir nos seus experimentos. Segundo disse, busca sócios caboclos. Alguém se habilita?
Claudio de Moura Castro é economista
Discurso de José Serra durante encontro com o governador da Califórnia Arnold Schwarzenegger em Copenhagen
I. Reduzir emissões de gases de efeito estufa sem afetar o desenvolvimento é uma tarefa possível. O mundo está diante de uma enorme encruzilhada e precisa fazer escolhas, difíceis, mas necessárias. Não deve acreditar que, para crescer, é preciso poluir, degradar e desperdiçar recursos. O crescimento econômico pode ser alcançado sem a ampliação das emissões de gases de efeito estufa.
Para isso, são fundamentais ações de eficiência energética, o uso de fontes renováveis de energia e a contenção do desmatamento. Eu só lembraria que o consumo europeu de energia é hoje metade do que seria sem as ações promovidas desde a primeira crise do petróleo, em 1973. Danos oriundos de desmatamento podem ser bastante diminuídos, mediante políticas racionais de exploração de recursos naturais.
A longo prazo, a deterioração ambiental implica elevados custos de adaptação, mitigação e compensação, que acabam comprometendo o próprio ritmo de crescimento econômico. Aos fenômenos já vivenciados de alterações no micro-clima, como ilhas de calor e intensa concentração de chuvas somam-se agora os eventos extremos causados pelas mudanças climáticas globais. Isso leva a uma pior qualidade de vida, a dificuldades imensas na gestão urbana e à necessidade de pesados investimentos para adaptação. Podem-se imaginar os perversos efeitos de mudanças de condições climáticas nos ecossistemas e em todos os setores da economia.
Portanto, nada melhor para a economia internacional e as economias nacionais do que o enfrentamento imediato e corajoso dos problemas ambientais, entre eles o principal, em escala global, que é o efeito estufa.
II. Iniciativas sub-nacionais, seja regionais ou locais, são fundamentais para o avanço da causa ambiental e para se chegar mais depressa a um acordo climático global. Este é o caso de estados como Califórnia, Quebec e São Paulo, de grande peso no desenvolvimento em seus países e fortes indutores de políticas nacionais. Compreendem regiões que adotaram um caminho ambicioso e sustentável de desenvolvimento.
O Estado de São Paulo apresenta área pouco maior que a do Reino Unido e sua população soma 41 milhões de pessoas. É dotado de boa infraestrutura de energia, transportes e telecomunicações, além de mão-de-obra qualificada. A economia e população do Estado são do tamanho da Argentina. Seu PIB equivale a um terço do PIB brasileiro; sua produção industrial, a mais de 40 por cento. O tamanho da população e da economia do Estado de São Paulo são maiores do que as de vários países presentes nesta Conferência de Copenhague e, portanto, nós também temos que implementar ações concretas na construção de uma solução para o desafio das mudanças climáticas. Deixem-me citar, brevemente, 10 questões que envolvem as condições ambientais do Estado.
1. São Paulo emitiu em 2005 cerca de 5% das emissões brasileiras. São 3 toneladas de CO2 equivalente por habitante por ano, um número baixo comparado a países desenvolvidos e menos de um quarto da média do Brasil, mais alta devido principalmente ao desmatamento da Amazônia e do cerrado.
2. O desmatamento no Estado foi contido com ações de fiscalização e de ordenamento territorial. A Mata Atlântica original cobre 14% de território de São Paulo. É um dos maiores santuários de biodiversidade do planeta
3. Nossa meta é recuperar 1 milhão de hectares de matas ciliares até 2020, o que permitirá absorver 70 milhões de toneladas de CO2. O processo de recuperação já envolve metade dessa área. Juntando-se isso à expansão do uso do etanol em veículos flex e à co-geração de energia, utilizando a biomassa, houve praticamente uma estabilização de nossas emissões de CO2, nos últimos 15 anos.
4. Sozinho, o Estado de São Paulo responde por quase 23 da produção nacional e por 15 da produção mundial de etanol, o mais importante e eficiente biocombustível veicular existente. Com os automóveis flex, o etanol vem se mostrando economicamente competitivo em relação à gasolina, sem a necessidade de subsídios governamentais.
5. Um subproduto da cana, o bagaço, hoje é fonte de energia limpa, produzindo calor de processo e bioeletricidade, em substituição a energias fósseis. Devido à hidroeletricidade e à biomassa, 56% da energia produzida no Estado é renovável.
6. Além disso, a garantia da sustentabilidade de todo o ciclo dos produtos da cana é prioritária em São Paulo. Estabelecemos um programa para banir em poucos anos a queima da palha como método de colheita, reduzindo consideravelmente as emissões atmosféricas.
7. Apesar do peso do etanol, muito ainda terá que ser feito para reduzir as emissões do setor de transportes. Temos investido maciçamente na ampliação dos meios de transporte urbanos sobre trilhos, nas cidades. Na região metropolitana da cidade de São Paulo, aumentaremos a capacidade de 4,1 milhões passageirosdia em 2006 para 9,2 milhões em 2014. Isso reduzirá as emissões em 1,6 milhões de toneladas de CO2 equivalentes por ano. Além disso, estamos construindo uma longa rodovia perimetral à região metropolitana de São Paulo, com cerca de 200 km, aliviando congestionamentos, poluição e emissões.
8. São Paulo, um grande mercado consumidor de madeira, tem um projeto estratégico chamado Amigo da Amazônia, pelo qual não se autoriza a entrada em nossas fronteiras estaduais de madeira extraída ilegalmente daquela região. O Governo do Estado só adquire madeira com certificado de origem.
9. Desenvolvemos amplos programas de adaptação climática: na cidade de São Paulo estamos implantando um conjunto de parques públicos que acompanham os córregos, e que, com suas matas ciliares, visam mitigar o impacto de cheias nos bairros. Este é a maior obra de adaptação em andamento na America do Sul.
10. A Fundação estadual que financia pesquisas acadêmicas, estabeleceu grandes programas de pesquisa em ciências do clima, em biocombustíveis de segunda geração e em biotecnologia, sempre em parceria com o setor privado. Cerca de 50 milhões de dólares estão alocados para pesquisa e desenvolvimento na área de bioenergia.
III. A iniciativa recente mais importante foi a lei que estabelece a Política Estadual de Mudanças Climáticas em meu estado. Ela fixa a obrigatoriedade de redução de 20% das emissões de CO2, responsáveis pelo efeito estufa, até o ano 2020, em relação a 2005. Ou seja, haverá uma redução absoluta de 25 milhões de toneladas de CO2 nas emissões do Estado. Este é um marco legal inédito em países em desenvolvimento.
A lei paulista (1) incorpora uma meta mandatória , não um compromisso voluntário; (2) prevê redução e emissão de CO2 em termos absolutos, não apenas desaceleração ou queda por unidade de PIB; (3) rompe o paradigma de bloqueio das atuais negociações climáticas, que se escuda em temas como o das responsabilidades históricas ; (4) prevê o estabelecimento de metas setoriais para direcionar as ações para mitigar CO2.
Para garantir transparência e rastreabilidade de nossas ações, estabelecemos uma Comunicação Estadual, nos moldes das Comunicações Nacionais das Partes da Convenção do Clima, contendo um inventário de emissões seguindo as diretrizes do IPCC - Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima - a ser atualizado a cada 5 anos.
A lei de São Paulo prevê ainda, dentre outros: (1) um mecanismo voluntário de registro público de emissões; (2) o mapeamento das vulnerabilidades climáticas; (3) um programa de proteção e recomposição de remanescentes florestais; (4) a elaboração de zoneamentos ecológico-econômicos; (5) a definição do primeiro marco legal para avaliação ambiental estratégica no Brasil; (6) a alocação de recursos para um fundo de adaptação; (7) outros incentivos financeiros, inclusive a oneração de atividades poluidoras e o mecanismo de compras verdes pelo Estado; (8) a integração da dimensão climática global no licenciamento ambiental de empreendimentos; (9) um plano integrado de transporte sustentável e (10) um conselho consultivo, com poderes de fiscalização do cumprimento da lei.
Recentes descobertas de vastas reservas de petróleo e gás na camada pré-sal da costa brasileira, inclusive a de São Paulo, trazem um novo desafio a São Paulo: o de conciliar seu desenvolvimento com a descarbonização de sua matriz. Isso deve ser feito por meio de três instrumentos: restrições ambientais, aumento da eficiência energética e promoção das energias renováveis.
IV. Creio que a ação propositiva do Governo do Estado de São Paulo ajudou o Brasil a avançar na sua proposta para a COP15, em especial a meta, ainda que voluntária, de mitigacão de emissões. O pioneirismo de governos regionais serve de exemplo para outras regiões em todo o mundo.
Governador Schwarznegger: não pude estar em seu estado, em outubro último, para participar da Cúpula de Governadores. Mas, aqui em Copenhague, assumo os mesmos compromissos e tenho a satisfação introduzir minha assinatura à Declaração daquela reunião. Além disso, orientei minha equipe para avançar nos termos de um acordo bilateral de cooperação entre os dois estados, envolvendo as áreas ambiental e de energia. O Estado de São Paulo tem interesse em ampliar o mercado mundial do etanol, um combustível renovável fundamental para a construção da nova economia verde proposta por nossas regiões e exemplarmente afirmadas aqui em nosso encontro.
O mundo tem uma expectativa que desta Conferência saia um acordo ambicioso, justo e legalmente vinculante. O mundo espera ver metas ousadas dos países ricos e dos países em desenvolvimento.
Aqui em Copenhague não estamos, de fato, discutindo um acordo ambiental, mas sim um novo paradigma de desenvolvimento, estamos falando sobre um novo modelo de desenvolvimento, industrial e agrícola, de empregos verdes, do fim do desmatamento e de uma nova matriz energética baseada em fontes renováveis. É injustificável que até hoje a comunidade internacional não tenha criado um Fundo para combater o aquecimento global e suas nefastas consequências. Para que tudo isso seja possível, é necessário financiamento de curto e longo prazo. As grandes economias - aliás, as que mais poluíram e continuam poluindo a atmosfera - têm a responsabilidade moral de colocar dinheiro na mesa na ordem de US$ 140 bilhões, e as economias emergentes certamente têm condições de investir seus recursos em uma economia de baixo carbono.
Estamos todos no mesmo barco e todos temos uma parcela de responsabilidade.
A sociedade civil trouxe 120 chefes de estado para Copenhague, a era do discurso já passou e agora estamos na era da ação. Eu vim à Dinamarca para dizer que São Paulo está preparado para fazer parte da solução e espero que os chefes de estado que aqui virão façam o mesmo.
Muito obrigado.
Categoria pai: Seção - Notícias
Discute-se se o projeto que está sendo elaborado pelo MEC, que estabelecerá a idade mínina de 6 anos (completos até 31 de março no ano da matrícula) para ingresso no Ensino Fundamental, traz ou não benefícios para os estudantes e para a educação no Brasil. Vejamos qual é a norma em alguns outros países. Na França, o equivalente à primeira série do Ensino Fundamental é cursado aos 6 anos e recebe crianças que vêm do último ano da pré-escola. Na Inglaterra, a alfabetização se inicia aos 5 anos nas classes de recepção, que preparam para a alfabetização. Nos Estados Unidos, o Congresso Nacional cortou recentemente verbas de um programa voltado para alfabetização de crianças de 3 a 4 anos por considerar seus resultados indefinidos, sem, contudo, reduzir as verbas para alfabetização na idade regular.
Um programa de alfabetização que tenha início aos 6 anos, como prevê o MEC, terá necessariamente de ser precedido da educação infantil, aberta a todas as crianças brasileiras. Essa etapa, marcada por atividades lúdicas, será destinada à preparação para o trabalho mais sistemático com a leitura e escrita no primeiro ano. A educação infantil é indispensável porque a maioria das famílias brasileiras não tem condição de oferecer às crianças uma iniciação prazerosa a práticas letradas. Para o início do trabalho efetivo com alfabetização, no entanto, é preciso aguardar um amadurecimento sociocognitivo das crianças. Nesses termos, o projeto do MEC é bem-vindo.
Professora Stella Bortoni, Faculdade de Educação, UnB, PhD em Linguística
Categoria pai: Seção - Notícias
Discurso de José Serra durante encontro com o governador da Califórnia Arnold Schwarzenegger em Copenhagen
I. Reduzir emissões de gases de efeito estufa sem afetar o desenvolvimento é uma tarefa possível. O mundo está diante de uma enorme encruzilhada e precisa fazer escolhas, difíceis, mas necessárias. Não deve acreditar que, para crescer, é preciso poluir, degradar e desperdiçar recursos. O crescimento econômico pode ser alcançado sem a ampliação das emissões de gases de efeito estufa.
Para isso, são fundamentais ações de eficiência energética, o uso de fontes renováveis de energia e a contenção do desmatamento. Eu só lembraria que o consumo europeu de energia é hoje metade do que seria sem as ações promovidas desde a primeira crise do petróleo, em 1973. Danos oriundos de desmatamento podem ser bastante diminuídos, mediante políticas racionais de exploração de recursos naturais.
A longo prazo, a deterioração ambiental implica elevados custos de adaptação, mitigação e compensação, que acabam comprometendo o próprio ritmo de crescimento econômico. Aos fenômenos já vivenciados de alterações no micro-clima, como ilhas de calor e intensa concentração de chuvas somam-se agora os eventos extremos causados pelas mudanças climáticas globais. Isso leva a uma pior qualidade de vida, a dificuldades imensas na gestão urbana e à necessidade de pesados investimentos para adaptação. Podem-se imaginar os perversos efeitos de mudanças de condições climáticas nos ecossistemas e em todos os setores da economia.
Portanto, nada melhor para a economia internacional e as economias nacionais do que o enfrentamento imediato e corajoso dos problemas ambientais, entre eles o principal, em escala global, que é o efeito estufa.
II. Iniciativas sub-nacionais, seja regionais ou locais, são fundamentais para o avanço da causa ambiental e para se chegar mais depressa a um acordo climático global. Este é o caso de estados como Califórnia, Quebec e São Paulo, de grande peso no desenvolvimento em seus países e fortes indutores de políticas nacionais. Compreendem regiões que adotaram um caminho ambicioso e sustentável de desenvolvimento.
O Estado de São Paulo apresenta área pouco maior que a do Reino Unido e sua população soma 41 milhões de pessoas. É dotado de boa infraestrutura de energia, transportes e telecomunicações, além de mão-de-obra qualificada. A economia e população do Estado são do tamanho da Argentina. Seu PIB equivale a um terço do PIB brasileiro; sua produção industrial, a mais de 40 por cento. O tamanho da população e da economia do Estado de São Paulo são maiores do que as de vários países presentes nesta Conferência de Copenhague e, portanto, nós também temos que implementar ações concretas na construção de uma solução para o desafio das mudanças climáticas. Deixem-me citar, brevemente, 10 questões que envolvem as condições ambientais do Estado.
1. São Paulo emitiu em 2005 cerca de 5% das emissões brasileiras. São 3 toneladas de CO2 equivalente por habitante por ano, um número baixo comparado a países desenvolvidos e menos de um quarto da média do Brasil, mais alta devido principalmente ao desmatamento da Amazônia e do cerrado.
2. O desmatamento no Estado foi contido com ações de fiscalização e de ordenamento territorial. A Mata Atlântica original cobre 14% de território de São Paulo. É um dos maiores santuários de biodiversidade do planeta
3. Nossa meta é recuperar 1 milhão de hectares de matas ciliares até 2020, o que permitirá absorver 70 milhões de toneladas de CO2. O processo de recuperação já envolve metade dessa área. Juntando-se isso à expansão do uso do etanol em veículos flex e à co-geração de energia, utilizando a biomassa, houve praticamente uma estabilização de nossas emissões de CO2, nos últimos 15 anos.
4. Sozinho, o Estado de São Paulo responde por quase 23 da produção nacional e por 15 da produção mundial de etanol, o mais importante e eficiente biocombustível veicular existente. Com os automóveis flex, o etanol vem se mostrando economicamente competitivo em relação à gasolina, sem a necessidade de subsídios governamentais.
5. Um subproduto da cana, o bagaço, hoje é fonte de energia limpa, produzindo calor de processo e bioeletricidade, em substituição a energias fósseis. Devido à hidroeletricidade e à biomassa, 56% da energia produzida no Estado é renovável.
6. Além disso, a garantia da sustentabilidade de todo o ciclo dos produtos da cana é prioritária em São Paulo. Estabelecemos um programa para banir em poucos anos a queima da palha como método de colheita, reduzindo consideravelmente as emissões atmosféricas.
7. Apesar do peso do etanol, muito ainda terá que ser feito para reduzir as emissões do setor de transportes. Temos investido maciçamente na ampliação dos meios de transporte urbanos sobre trilhos, nas cidades. Na região metropolitana da cidade de São Paulo, aumentaremos a capacidade de 4,1 milhões passageirosdia em 2006 para 9,2 milhões em 2014. Isso reduzirá as emissões em 1,6 milhões de toneladas de CO2 equivalentes por ano. Além disso, estamos construindo uma longa rodovia perimetral à região metropolitana de São Paulo, com cerca de 200 km, aliviando congestionamentos, poluição e emissões.
8. São Paulo, um grande mercado consumidor de madeira, tem um projeto estratégico chamado Amigo da Amazônia, pelo qual não se autoriza a entrada em nossas fronteiras estaduais de madeira extraída ilegalmente daquela região. O Governo do Estado só adquire madeira com certificado de origem.
9. Desenvolvemos amplos programas de adaptação climática: na cidade de São Paulo estamos implantando um conjunto de parques públicos que acompanham os córregos, e que, com suas matas ciliares, visam mitigar o impacto de cheias nos bairros. Este é a maior obra de adaptação em andamento na America do Sul.
10. A Fundação estadual que financia pesquisas acadêmicas, estabeleceu grandes programas de pesquisa em ciências do clima, em biocombustíveis de segunda geração e em biotecnologia, sempre em parceria com o setor privado. Cerca de 50 milhões de dólares estão alocados para pesquisa e desenvolvimento na área de bioenergia.
III. A iniciativa recente mais importante foi a lei que estabelece a Política Estadual de Mudanças Climáticas em meu estado. Ela fixa a obrigatoriedade de redução de 20% das emissões de CO2, responsáveis pelo efeito estufa, até o ano 2020, em relação a 2005. Ou seja, haverá uma redução absoluta de 25 milhões de toneladas de CO2 nas emissões do Estado. Este é um marco legal inédito em países em desenvolvimento.
A lei paulista (1) incorpora uma meta mandatória , não um compromisso voluntário; (2) prevê redução e emissão de CO2 em termos absolutos, não apenas desaceleração ou queda por unidade de PIB; (3) rompe o paradigma de bloqueio das atuais negociações climáticas, que se escuda em temas como o das responsabilidades históricas ; (4) prevê o estabelecimento de metas setoriais para direcionar as ações para mitigar CO2.
Para garantir transparência e rastreabilidade de nossas ações, estabelecemos uma Comunicação Estadual, nos moldes das Comunicações Nacionais das Partes da Convenção do Clima, contendo um inventário de emissões seguindo as diretrizes do IPCC - Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima - a ser atualizado a cada 5 anos.
A lei de São Paulo prevê ainda, dentre outros: (1) um mecanismo voluntário de registro público de emissões; (2) o mapeamento das vulnerabilidades climáticas; (3) um programa de proteção e recomposição de remanescentes florestais; (4) a elaboração de zoneamentos ecológico-econômicos; (5) a definição do primeiro marco legal para avaliação ambiental estratégica no Brasil; (6) a alocação de recursos para um fundo de adaptação; (7) outros incentivos financeiros, inclusive a oneração de atividades poluidoras e o mecanismo de compras verdes pelo Estado; (8) a integração da dimensão climática global no licenciamento ambiental de empreendimentos; (9) um plano integrado de transporte sustentável e (10) um conselho consultivo, com poderes de fiscalização do cumprimento da lei.
Recentes descobertas de vastas reservas de petróleo e gás na camada pré-sal da costa brasileira, inclusive a de São Paulo, trazem um novo desafio a São Paulo: o de conciliar seu desenvolvimento com a descarbonização de sua matriz. Isso deve ser feito por meio de três instrumentos: restrições ambientais, aumento da eficiência energética e promoção das energias renováveis.
IV. Creio que a ação propositiva do Governo do Estado de São Paulo ajudou o Brasil a avançar na sua proposta para a COP15, em especial a meta, ainda que voluntária, de mitigacão de emissões. O pioneirismo de governos regionais serve de exemplo para outras regiões em todo o mundo.
Governador Schwarznegger: não pude estar em seu estado, em outubro último, para participar da Cúpula de Governadores. Mas, aqui em Copenhague, assumo os mesmos compromissos e tenho a satisfação introduzir minha assinatura à Declaração daquela reunião. Além disso, orientei minha equipe para avançar nos termos de um acordo bilateral de cooperação entre os dois estados, envolvendo as áreas ambiental e de energia. O Estado de São Paulo tem interesse em ampliar o mercado mundial do etanol, um combustível renovável fundamental para a construção da nova economia verde proposta por nossas regiões e exemplarmente afirmadas aqui em nosso encontro.
O mundo tem uma expectativa que desta Conferência saia um acordo ambicioso, justo e legalmente vinculante. O mundo espera ver metas ousadas dos países ricos e dos países em desenvolvimento.
Aqui em Copenhague não estamos, de fato, discutindo um acordo ambiental, mas sim um novo paradigma de desenvolvimento, estamos falando sobre um novo modelo de desenvolvimento, industrial e agrícola, de empregos verdes, do fim do desmatamento e de uma nova matriz energética baseada em fontes renováveis. É injustificável que até hoje a comunidade internacional não tenha criado um Fundo para combater o aquecimento global e suas nefastas consequências. Para que tudo isso seja possível, é necessário financiamento de curto e longo prazo. As grandes economias - aliás, as que mais poluíram e continuam poluindo a atmosfera - têm a responsabilidade moral de colocar dinheiro na mesa na ordem de US$ 140 bilhões, e as economias emergentes certamente têm condições de investir seus recursos em uma economia de baixo carbono.
Estamos todos no mesmo barco e todos temos uma parcela de responsabilidade.
A sociedade civil trouxe 120 chefes de estado para Copenhague, a era do discurso já passou e agora estamos na era da ação. Eu vim à Dinamarca para dizer que São Paulo está preparado para fazer parte da solução e espero que os chefes de estado que aqui virão façam o mesmo.
Muito obrigado.
Categoria pai: Seção - Notícias
Discurso de José Serra durante encontro com o governador da Califórnia Arnold Schwarzenegger em Copenhagen
I. Reduzir emissões de gases de efeito estufa sem afetar o desenvolvimento é uma tarefa possível. O mundo está diante de uma enorme encruzilhada e precisa fazer escolhas, difíceis, mas necessárias. Não deve acreditar que, para crescer, é preciso poluir, degradar e desperdiçar recursos. O crescimento econômico pode ser alcançado sem a ampliação das emissões de gases de efeito estufa.
III. A iniciativa recente mais importante foi a lei que estabelece a Política Estadual de Mudanças Climáticas em meu estado. Ela fixa a obrigatoriedade de redução de 20% das emissões de CO2, responsáveis pelo efeito estufa, até o ano 2020, em relação a 2005. Ou seja, haverá uma redução absoluta de 25 milhões de toneladas de CO2 nas emissões do Estado. Este é um marco legal inédito em países em desenvolvimento.
A lei paulista (1) incorpora uma meta mandatória , não um compromisso voluntário; (2) prevê redução e emissão de CO2 em termos absolutos, não apenas desaceleração ou queda por unidade de PIB; (3) rompe o paradigma de bloqueio das atuais negociações climáticas, que se escuda em temas como o das responsabilidades históricas ; (4) prevê o estabelecimento de metas setoriais para direcionar as ações para mitigar CO2.
Para garantir transparência e rastreabilidade de nossas ações, estabelecemos uma Comunicação Estadual, nos moldes das Comunicações Nacionais das Partes da Convenção do Clima, contendo um inventário de emissões seguindo as diretrizes do IPCC - Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima - a ser atualizado a cada 5 anos.
A lei de São Paulo prevê ainda, dentre outros: (1) um mecanismo voluntário de registro público de emissões; (2) o mapeamento das vulnerabilidades climáticas; (3) um programa de proteção e recomposição de remanescentes florestais; (4) a elaboração de zoneamentos ecológico-econômicos; (5) a definição do primeiro marco legal para avaliação ambiental estratégica no Brasil; (6) a alocação de recursos para um fundo de adaptação; (7) outros incentivos financeiros, inclusive a oneração de atividades poluidoras e o mecanismo de compras verdes pelo Estado; (8) a integração da dimensão climática global no licenciamento ambiental de empreendimentos; (9) um plano integrado de transporte sustentável e (10) um conselho consultivo, com poderes de fiscalização do cumprimento da lei.
Recentes descobertas de vastas reservas de petróleo e gás na camada pré-sal da costa brasileira, inclusive a de São Paulo, trazem um novo desafio a São Paulo: o de conciliar seu desenvolvimento com a descarbonização de sua matriz. Isso deve ser feito por meio de três instrumentos: restrições ambientais, aumento da eficiência energética e promoção das energias renováveis.
Para isso, são fundamentais ações de eficiência energética, o uso de fontes renováveis de energia e a contenção do desmatamento. Eu só lembraria que o consumo europeu de energia é hoje metade do que seria sem as ações promovidas desde a primeira crise do petróleo, em 1973. Danos oriundos de desmatamento podem ser bastante diminuídos, mediante políticas racionais de exploração de recursos naturais.
A longo prazo, a deterioração ambiental implica elevados custos de adaptação, mitigação e compensação, que acabam comprometendo o próprio ritmo de crescimento econômico. Aos fenômenos já vivenciados de alterações no micro-clima, como ilhas de calor e intensa concentração de chuvas somam-se agora os eventos extremos causados pelas mudanças climáticas globais. Isso leva a uma pior qualidade de vida, a dificuldades imensas na gestão urbana e à necessidade de pesados investimentos para adaptação. Podem-se imaginar os perversos efeitos de mudanças de condições climáticas nos ecossistemas e em todos os setores da economia.
Portanto, nada melhor para a economia internacional e as economias nacionais do que o enfrentamento imediato e corajoso dos problemas ambientais, entre eles o principal, em escala global, que é o efeito estufa.
II. Iniciativas sub-nacionais, seja regionais ou locais, são fundamentais para o avanço da causa ambiental e para se chegar mais depressa a um acordo climático global. Este é o caso de estados como Califórnia, Quebec e São Paulo, de grande peso no desenvolvimento em seus países e fortes indutores de políticas nacionais. Compreendem regiões que adotaram um caminho ambicioso e sustentável de desenvolvimento.
O Estado de São Paulo apresenta área pouco maior que a do Reino Unido e sua população soma 41 milhões de pessoas. É dotado de boa infraestrutura de energia, transportes e telecomunicações, além de mão-de-obra qualificada. A economia e população do Estado são do tamanho da Argentina. Seu PIB equivale a um terço do PIB brasileiro; sua produção industrial, a mais de 40 por cento. O tamanho da população e da economia do Estado de São Paulo são maiores do que as de vários países presentes nesta Conferência de Copenhague e, portanto, nós também temos que implementar ações concretas na construção de uma solução para o desafio das mudanças climáticas. Deixem-me citar, brevemente, 10 questões que envolvem as condições ambientais do Estado.
1. São Paulo emitiu em 2005 cerca de 5% das emissões brasileiras. São 3 toneladas de CO2 equivalente por habitante por ano, um número baixo comparado a países desenvolvidos e menos de um quarto da média do Brasil, mais alta devido principalmente ao desmatamento da Amazônia e do cerrado.
2. O desmatamento no Estado foi contido com ações de fiscalização e de ordenamento territorial. A Mata Atlântica original cobre 14% de território de São Paulo. É um dos maiores santuários de biodiversidade do planeta
3. Nossa meta é recuperar 1 milhão de hectares de matas ciliares até 2020, o que permitirá absorver 70 milhões de toneladas de CO2. O processo de recuperação já envolve metade dessa área. Juntando-se isso à expansão do uso do etanol em veículos flex e à co-geração de energia, utilizando a biomassa, houve praticamente uma estabilização de nossas emissões de CO2, nos últimos 15 anos.
4. Sozinho, o Estado de São Paulo responde por quase 23 da produção nacional e por 15 da produção mundial de etanol, o mais importante e eficiente biocombustível veicular existente. Com os automóveis flex, o etanol vem se mostrando economicamente competitivo em relação à gasolina, sem a necessidade de subsídios governamentais.
5. Um subproduto da cana, o bagaço, hoje é fonte de energia limpa, produzindo calor de processo e bioeletricidade, em substituição a energias fósseis. Devido à hidroeletricidade e à biomassa, 56% da energia produzida no Estado é renovável.
6. Além disso, a garantia da sustentabilidade de todo o ciclo dos produtos da cana é prioritária em São Paulo. Estabelecemos um programa para banir em poucos anos a queima da palha como método de colheita, reduzindo consideravelmente as emissões atmosféricas.
7. Apesar do peso do etanol, muito ainda terá que ser feito para reduzir as emissões do setor de transportes. Temos investido maciçamente na ampliação dos meios de transporte urbanos sobre trilhos, nas cidades. Na região metropolitana da cidade de São Paulo, aumentaremos a capacidade de 4,1 milhões passageirosdia em 2006 para 9,2 milhões em 2014. Isso reduzirá as emissões em 1,6 milhões de toneladas de CO2 equivalentes por ano. Além disso, estamos construindo uma longa rodovia perimetral à região metropolitana de São Paulo, com cerca de 200 km, aliviando congestionamentos, poluição e emissões.
8. São Paulo, um grande mercado consumidor de madeira, tem um projeto estratégico chamado Amigo da Amazônia, pelo qual não se autoriza a entrada em nossas fronteiras estaduais de madeira extraída ilegalmente daquela região. O Governo do Estado só adquire madeira com certificado de origem.
9. Desenvolvemos amplos programas de adaptação climática: na cidade de São Paulo estamos implantando um conjunto de parques públicos que acompanham os córregos, e que, com suas matas ciliares, visam mitigar o impacto de cheias nos bairros. Este é a maior obra de adaptação em andamento na America do Sul.
10. A Fundação estadual que financia pesquisas acadêmicas, estabeleceu grandes programas de pesquisa em ciências do clima, em biocombustíveis de segunda geração e em biotecnologia, sempre em parceria com o setor privado. Cerca de 50 milhões de dólares estão alocados para pesquisa e desenvolvimento na área de bioenergia.
IV. Creio que a ação propositiva do Governo do Estado de São Paulo ajudou o Brasil a avançar na sua proposta para a COP15, em especial a meta, ainda que voluntária, de mitigacão de emissões. O pioneirismo de governos regionais serve de exemplo para outras regiões em todo o mundo.
Governador Schwarznegger: não pude estar em seu estado, em outubro último, para participar da Cúpula de Governadores. Mas, aqui em Copenhague, assumo os mesmos compromissos e tenho a satisfação introduzir minha assinatura à Declaração daquela reunião. Além disso, orientei minha equipe para avançar nos termos de um acordo bilateral de cooperação entre os dois estados, envolvendo as áreas ambiental e de energia. O Estado de São Paulo tem interesse em ampliar o mercado mundial do etanol, um combustível renovável fundamental para a construção da nova economia verde proposta por nossas regiões e exemplarmente afirmadas aqui em nosso encontro.
O mundo tem uma expectativa que desta Conferência saia um acordo ambicioso, justo e legalmente vinculante. O mundo espera ver metas ousadas dos países ricos e dos países em desenvolvimento.
Aqui em Copenhague não estamos, de fato, discutindo um acordo ambiental, mas sim um novo paradigma de desenvolvimento, estamos falando sobre um novo modelo de desenvolvimento, industrial e agrícola, de empregos verdes, do fim do desmatamento e de uma nova matriz energética baseada em fontes renováveis. É injustificável que até hoje a comunidade internacional não tenha criado um Fundo para combater o aquecimento global e suas nefastas consequências. Para que tudo isso seja possível, é necessário financiamento de curto e longo prazo. As grandes economias - aliás, as que mais poluíram e continuam poluindo a atmosfera - têm a responsabilidade moral de colocar dinheiro na mesa na ordem de US$ 140 bilhões, e as economias emergentes certamente têm condições de investir seus recursos em uma economia de baixo carbono.
Estamos todos no mesmo barco e todos temos uma parcela de responsabilidade.
A sociedade civil trouxe 120 chefes de estado para Copenhague, a era do discurso já passou e agora estamos na era da ação. Eu vim à Dinamarca para dizer que São Paulo está preparado para fazer parte da solução e espero que os chefes de estado que aqui virão façam o mesmo.
Muito obrigado.
Discute-se se o projeto que está sendo elaborado pelo MEC, que estabelecerá a idade mínina de 6 anos (completos até 31 de março no ano da matrícula) para ingresso no Ensino Fundamental, traz ou não benefícios para os estudantes e para a educação no Brasil. Vejamos qual é a norma em alguns outros países. Na França, o equivalente à primeira série do Ensino Fundamental é cursado aos 6 anos e recebe crianças que vêm do último ano da pré-escola. Na Inglaterra, a alfabetização se inicia aos 5 anos nas classes de recepção, que preparam para a alfabetização. Nos Estados Unidos, o Congresso Nacional cortou recentemente verbas de um programa voltado para alfabetização de crianças de 3 a 4 anos por considerar seus resultados indefinidos, sem, contudo, reduzir as verbas para alfabetização na idade regular.
Um programa de alfabetização que tenha início aos 6 anos, como prevê o MEC, terá necessariamente de ser precedido da educação infantil, aberta a todas as crianças brasileiras. Essa etapa, marcada por atividades lúdicas, será destinada à preparação para o trabalho mais sistemático com a leitura e escrita no primeiro ano. A educação infantil é indispensável porque a maioria das famílias brasileiras não tem condição de oferecer às crianças uma iniciação prazerosa a práticas letradas. Para o início do trabalho efetivo com alfabetização, no entanto, é preciso aguardar um amadurecimento sociocognitivo das crianças. Nesses termos, o projeto do MEC é bem-vindo.
Professora Stella Bortoni, Faculdade de Educação, UnB, PhD em Linguística
Discurso de José Serra durante encontro com o governador da Califórnia Arnold Schwarzenegger em Copenhagen
I. Reduzir emissões de gases de efeito estufa sem afetar o desenvolvimento é uma tarefa possível. O mundo está diante de uma enorme encruzilhada e precisa fazer escolhas, difíceis, mas necessárias. Não deve acreditar que, para crescer, é preciso poluir, degradar e desperdiçar recursos. O crescimento econômico pode ser alcançado sem a ampliação das emissões de gases de efeito estufa.
III. A iniciativa recente mais importante foi a lei que estabelece a Política Estadual de Mudanças Climáticas em meu estado. Ela fixa a obrigatoriedade de redução de 20% das emissões de CO2, responsáveis pelo efeito estufa, até o ano 2020, em relação a 2005. Ou seja, haverá uma redução absoluta de 25 milhões de toneladas de CO2 nas emissões do Estado. Este é um marco legal inédito em países em desenvolvimento.
A lei paulista (1) incorpora uma meta mandatória , não um compromisso voluntário; (2) prevê redução e emissão de CO2 em termos absolutos, não apenas desaceleração ou queda por unidade de PIB; (3) rompe o paradigma de bloqueio das atuais negociações climáticas, que se escuda em temas como o das responsabilidades históricas ; (4) prevê o estabelecimento de metas setoriais para direcionar as ações para mitigar CO2.
Para garantir transparência e rastreabilidade de nossas ações, estabelecemos uma Comunicação Estadual, nos moldes das Comunicações Nacionais das Partes da Convenção do Clima, contendo um inventário de emissões seguindo as diretrizes do IPCC - Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima - a ser atualizado a cada 5 anos.
A lei de São Paulo prevê ainda, dentre outros: (1) um mecanismo voluntário de registro público de emissões; (2) o mapeamento das vulnerabilidades climáticas; (3) um programa de proteção e recomposição de remanescentes florestais; (4) a elaboração de zoneamentos ecológico-econômicos; (5) a definição do primeiro marco legal para avaliação ambiental estratégica no Brasil; (6) a alocação de recursos para um fundo de adaptação; (7) outros incentivos financeiros, inclusive a oneração de atividades poluidoras e o mecanismo de compras verdes pelo Estado; (8) a integração da dimensão climática global no licenciamento ambiental de empreendimentos; (9) um plano integrado de transporte sustentável e (10) um conselho consultivo, com poderes de fiscalização do cumprimento da lei.
Recentes descobertas de vastas reservas de petróleo e gás na camada pré-sal da costa brasileira, inclusive a de São Paulo, trazem um novo desafio a São Paulo: o de conciliar seu desenvolvimento com a descarbonização de sua matriz. Isso deve ser feito por meio de três instrumentos: restrições ambientais, aumento da eficiência energética e promoção das energias renováveis.
Para isso, são fundamentais ações de eficiência energética, o uso de fontes renováveis de energia e a contenção do desmatamento. Eu só lembraria que o consumo europeu de energia é hoje metade do que seria sem as ações promovidas desde a primeira crise do petróleo, em 1973. Danos oriundos de desmatamento podem ser bastante diminuídos, mediante políticas racionais de exploração de recursos naturais.
A longo prazo, a deterioração ambiental implica elevados custos de adaptação, mitigação e compensação, que acabam comprometendo o próprio ritmo de crescimento econômico. Aos fenômenos já vivenciados de alterações no micro-clima, como ilhas de calor e intensa concentração de chuvas somam-se agora os eventos extremos causados pelas mudanças climáticas globais. Isso leva a uma pior qualidade de vida, a dificuldades imensas na gestão urbana e à necessidade de pesados investimentos para adaptação. Podem-se imaginar os perversos efeitos de mudanças de condições climáticas nos ecossistemas e em todos os setores da economia.
Portanto, nada melhor para a economia internacional e as economias nacionais do que o enfrentamento imediato e corajoso dos problemas ambientais, entre eles o principal, em escala global, que é o efeito estufa.
II. Iniciativas sub-nacionais, seja regionais ou locais, são fundamentais para o avanço da causa ambiental e para se chegar mais depressa a um acordo climático global. Este é o caso de estados como Califórnia, Quebec e São Paulo, de grande peso no desenvolvimento em seus países e fortes indutores de políticas nacionais. Compreendem regiões que adotaram um caminho ambicioso e sustentável de desenvolvimento.
O Estado de São Paulo apresenta área pouco maior que a do Reino Unido e sua população soma 41 milhões de pessoas. É dotado de boa infraestrutura de energia, transportes e telecomunicações, além de mão-de-obra qualificada. A economia e população do Estado são do tamanho da Argentina. Seu PIB equivale a um terço do PIB brasileiro; sua produção industrial, a mais de 40 por cento. O tamanho da população e da economia do Estado de São Paulo são maiores do que as de vários países presentes nesta Conferência de Copenhague e, portanto, nós também temos que implementar ações concretas na construção de uma solução para o desafio das mudanças climáticas. Deixem-me citar, brevemente, 10 questões que envolvem as condições ambientais do Estado.
1. São Paulo emitiu em 2005 cerca de 5% das emissões brasileiras. São 3 toneladas de CO2 equivalente por habitante por ano, um número baixo comparado a países desenvolvidos e menos de um quarto da média do Brasil, mais alta devido principalmente ao desmatamento da Amazônia e do cerrado.
2. O desmatamento no Estado foi contido com ações de fiscalização e de ordenamento territorial. A Mata Atlântica original cobre 14% de território de São Paulo. É um dos maiores santuários de biodiversidade do planeta
3. Nossa meta é recuperar 1 milhão de hectares de matas ciliares até 2020, o que permitirá absorver 70 milhões de toneladas de CO2. O processo de recuperação já envolve metade dessa área. Juntando-se isso à expansão do uso do etanol em veículos flex e à co-geração de energia, utilizando a biomassa, houve praticamente uma estabilização de nossas emissões de CO2, nos últimos 15 anos.
4. Sozinho, o Estado de São Paulo responde por quase 23 da produção nacional e por 15 da produção mundial de etanol, o mais importante e eficiente biocombustível veicular existente. Com os automóveis flex, o etanol vem se mostrando economicamente competitivo em relação à gasolina, sem a necessidade de subsídios governamentais.
5. Um subproduto da cana, o bagaço, hoje é fonte de energia limpa, produzindo calor de processo e bioeletricidade, em substituição a energias fósseis. Devido à hidroeletricidade e à biomassa, 56% da energia produzida no Estado é renovável.
6. Além disso, a garantia da sustentabilidade de todo o ciclo dos produtos da cana é prioritária em São Paulo. Estabelecemos um programa para banir em poucos anos a queima da palha como método de colheita, reduzindo consideravelmente as emissões atmosféricas.
7. Apesar do peso do etanol, muito ainda terá que ser feito para reduzir as emissões do setor de transportes. Temos investido maciçamente na ampliação dos meios de transporte urbanos sobre trilhos, nas cidades. Na região metropolitana da cidade de São Paulo, aumentaremos a capacidade de 4,1 milhões passageirosdia em 2006 para 9,2 milhões em 2014. Isso reduzirá as emissões em 1,6 milhões de toneladas de CO2 equivalentes por ano. Além disso, estamos construindo uma longa rodovia perimetral à região metropolitana de São Paulo, com cerca de 200 km, aliviando congestionamentos, poluição e emissões.
8. São Paulo, um grande mercado consumidor de madeira, tem um projeto estratégico chamado Amigo da Amazônia, pelo qual não se autoriza a entrada em nossas fronteiras estaduais de madeira extraída ilegalmente daquela região. O Governo do Estado só adquire madeira com certificado de origem.
9. Desenvolvemos amplos programas de adaptação climática: na cidade de São Paulo estamos implantando um conjunto de parques públicos que acompanham os córregos, e que, com suas matas ciliares, visam mitigar o impacto de cheias nos bairros. Este é a maior obra de adaptação em andamento na America do Sul.
10. A Fundação estadual que financia pesquisas acadêmicas, estabeleceu grandes programas de pesquisa em ciências do clima, em biocombustíveis de segunda geração e em biotecnologia, sempre em parceria com o setor privado. Cerca de 50 milhões de dólares estão alocados para pesquisa e desenvolvimento na área de bioenergia.
IV. Creio que a ação propositiva do Governo do Estado de São Paulo ajudou o Brasil a avançar na sua proposta para a COP15, em especial a meta, ainda que voluntária, de mitigacão de emissões. O pioneirismo de governos regionais serve de exemplo para outras regiões em todo o mundo.
Governador Schwarznegger: não pude estar em seu estado, em outubro último, para participar da Cúpula de Governadores. Mas, aqui em Copenhague, assumo os mesmos compromissos e tenho a satisfação introduzir minha assinatura à Declaração daquela reunião. Além disso, orientei minha equipe para avançar nos termos de um acordo bilateral de cooperação entre os dois estados, envolvendo as áreas ambiental e de energia. O Estado de São Paulo tem interesse em ampliar o mercado mundial do etanol, um combustível renovável fundamental para a construção da nova economia verde proposta por nossas regiões e exemplarmente afirmadas aqui em nosso encontro.
O mundo tem uma expectativa que desta Conferência saia um acordo ambicioso, justo e legalmente vinculante. O mundo espera ver metas ousadas dos países ricos e dos países em desenvolvimento.
Aqui em Copenhague não estamos, de fato, discutindo um acordo ambiental, mas sim um novo paradigma de desenvolvimento, estamos falando sobre um novo modelo de desenvolvimento, industrial e agrícola, de empregos verdes, do fim do desmatamento e de uma nova matriz energética baseada em fontes renováveis. É injustificável que até hoje a comunidade internacional não tenha criado um Fundo para combater o aquecimento global e suas nefastas consequências. Para que tudo isso seja possível, é necessário financiamento de curto e longo prazo. As grandes economias - aliás, as que mais poluíram e continuam poluindo a atmosfera - têm a responsabilidade moral de colocar dinheiro na mesa na ordem de US$ 140 bilhões, e as economias emergentes certamente têm condições de investir seus recursos em uma economia de baixo carbono.
Estamos todos no mesmo barco e todos temos uma parcela de responsabilidade.
A sociedade civil trouxe 120 chefes de estado para Copenhague, a era do discurso já passou e agora estamos na era da ação. Eu vim à Dinamarca para dizer que São Paulo está preparado para fazer parte da solução e espero que os chefes de estado que aqui virão façam o mesmo.
Muito obrigado.