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*Culpar a juventude? Ah, não esculacha!*

Estacionei a bicicleta em frente ao BB lanches e, enquanto acertava as
extremidades da tranca, ouvia a conversa da rapaziada.

- Aquele som é irado. Frenético.

- Caraca, bródi, mandaí. Fiquei bolado.

- Sinistro.

Atei o cadeado, empinei o nariz e tive certeza de que o som era um rap, um
funk, ou algo que não soasse minimamente eficaz sem uma roda de subwoofers
estourando o asfalto.

Entre as gírias, contudo, identifiquei elementos estranhos ao contexto
aprioristicamente estabelecido (precontexto?): - Anos 60, bródi, a música
brasileira bombava, Edu Lobo era sinistro, compositor de responsa. Ponteio
ganhou o festival, tá ligado? Ponteio, tá ligaaaaado, bródi????? Pisquei
umas três vezes para checar se era a endorfina que me fazia ouvir vozes e
dei uma porrada no tornozelo em vias de câimbra.

Mas as vozes não davam trégua: - Viu o Quarteto Novo no acompanhamento,
bródi? Quarteto Novo e Edu Lobo era um esculacho, Hermeto quebrava tudo.

Era isso mesmo: os presumidos três patetas, que minutos antes não passavam
de uns manés mais alienados que a própria alienação, convertiam-se, num
átimo, em adolescentes esclarecidos, discutindo, com os recursos idiomáticos
à disposição, o panorama da música brasileira nos anos 60, e faziam juízos
de valor numa escala primária, mas correta.

Dias antes, num debate do qual participara na Biblioteca Nacional, para um
público de ensino médio (com Mauro Ventura e Vítor Iório na mesa), alguém,
entre os catedráticos presentes, puxou a ladainha: - A juventude não lê. Não
sabe de nada.

Fica à mercê da televisão e da internet.

Eu, que sou bem mais jovem que o dito catedrático, já defendi muito essa
ideia, que pode ter lá suas razões de ser. Mas, diante de um público de
ensino médio atento, simpático e interessado, puxei pelo meu registro mais
moderado e, talvez, temperado pelos primeiros ventos da maturidade.

- Quer saber? Cansei dessa conversa de que a juventude não lê. E, se não lê,
de quem é a culpa? Dos professores, do ensino, do desprezo pelo conhecimento
de humanidades, do espírito de competição acirrada e de interesse
ultraespecializado, da falta de ideias e, sobretudo, da ausência de um chefe
de Estado que faça a revolução pela educação, aquela que ninguém tem coragem
de assumir como prioridade? - discursei.

Uma semana depois, em bate-papo com a atual turma de estagiários do GLOBO
(cheia de gente a fim de inovar) conduzido pelo Luiz Paulo Horta, eu
repercutia minhas impressões, partindo para uma autocrítica de meus tempos
de adolescente em Copacabana.

- A gente fala muito das novas gerações, mas se eu for analisar, passei a
minha juventude assistindo a Star Trek, Vila Sésamo, chupão da Sandra
Bréa na novela das dez e, nos intervalos, folheando revista de mulher
pelada. Tudo bem que as noites eu consumia em claro lendo clássicos
(indicados por meu pai, não pela escola) e tentando escrever uma obra-prima
(nos intervalos, mais mulher pelada...), e pela manhã mamãe achava que eu
estava tuberculoso. Consciência política, nascido que fui em 1965 e não
tendo tido pais militantes, a minha, então, era zerinho da Silva. Só acordei
para a vida ao gongo de Vianninha e Millôr, quando a censura caiu aos 45 do
segundo tempo, e os teatros fervilharam.

Tudo isso para dizer que essas sentenças sobre a juventude dos outros são o
maior papo brabo. Um colega aqui da arte discorda: diz que o tal encontro no
bicicletário do BB lanches foi como um raio divino, exceção das exceções, o
cara citando Edu devia estudar música, daí aquela espuma de conhecimento
borbulhando no mar de gírias.

Sei não. Saber escolher o que ler e o que saber na internet não é muito
diferente de se antenar com as prateleiras de uma biblioteca.

Sem interesse, sem paixão, não se vai encontrar nada que preste, no papel ou
no monitor, hoje ou há cem anos, com as gírias de hoje ou as do baú do
tataravô.

Dizem que o mundo atual é tribalista. Quem quiser conversar sobre o quanto
Edu Lobo é irado, tá ligado, bródi? (no meu tempo eu diria Edu Lobo é um
barato, morou, xará?, e meu pai talvez dissesse Edu Lobo é bacana, manja,
meu chapa?, e vovô diria que o Edu é batuta, supimpa, XPTO, e vamos), mas
como eu ia dizendo, quem quiser encher a bola de Edu Lobo vai encontrar a
turma certa na casa de sucos certa, na gíria certa, sem prejuízo ou exclusão
da turma do funk, isso quando as duas turmas não se cruzarem nas fusion
sessions ou nas pistas ao som de remixes geniais. E digo mais: uhuuuuu,
isssssssa, cáspite, caraca.

Culpar a juventude é o mesmo que culpar a política, o jornalismo, o direito,
a medicina, pelos erros do político, do jornalista, do juiz, do médico. O
mesmo que culpar o funk pela violência dos indivíduos. É o medo de olhar
para o umbigo da própria ignorância, o envelhecimento das ideias, a preguiça
de transformar, de compreender as novas falas quando estas anseiam por
conhecimento mas rejeitam o bolor e o peso de métodos, currículos e
formações ora substanciais no conteúdo e velhas no código, ora vazias de
saber e mais modernas que a modernidade.

Viva a juventude. Viva Edu Lobo. Viva o funk. E viva a educação.



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*O Globo*, 18 jul. 2009.

(Fonte: CVL)

Categoria pai: Seção - Notícias

 



 

Exmo. Sr. Ministro da Educação - Fernando Haddad
ac: Chefe de Gabinete - João Paulo Bachur
Esplanada dos Ministérios Bl. L - Ed. Sede - 8º andar sala 805
Brasília - DF, CEP: 70.047-900
Telefone(s): (61)2104-85208163
 

Senhor Ministro da Educação,

 

Nos últimos 15 anos, as Neurociências têm produzido notáveis progressos na descoberta de indicações e contra-indicações de diversos procedimentos educacionais para alunos com os mais variados quadros de deficiências e transtornos de linguagem oral, escrita e de sinais de etiologia neurossensorial (surdez congênita profunda), neurolinguística (dislexia do desenvolvimento, afasia) e neuromotora (paralisia cerebral). As pesquisas na área têm demonstrado fartamente que o sucesso de políticas públicas em Educação tem sido condicionado à atenta consideração desses progressos científicos sobre a eficácia diferencial de diferentes abordagens educacionais para diferentes quadros de deficiência e de distúrbios.

 

Na Universidade de São Paulo, durante os últimos 15 anos, com patrocínio do CNPq, da Capes, do Inep, da Fundação Vitae, e da Fapesp, temos conduzido um dos maiores, mais rigorosos e mais compreensivos estudos do mundo sobre desenvolvimento cognitivo e linguístico de crianças surdas e deficientes auditivas. Para ilustrar isso, num dos estudos, avaliamos 8.000 alunos surdos, oriundos de 15 estados de todas as regiões geográficas brasileiras, e provenientes de todos os níveis educacionais, desde a educação infantil até a conclusão do ensino superior. Essa, que é uma das maiores e mais compreensivas pesquisas científicas já conduzidas sobre educação de uma população escolar surda e deficiente auditiva, avaliou cada um dos 8.000 alunos em mais de 20 instrumentos validados e normatizados que mensuram competências como leitura e escrita alfabéticas, compreensão de textos e de sinais, leitura orofacial e vocabulário em Português, e produção de textos, dentre outras. O nível de cada uma das competências foi avaliado como função da alocação escolar (escola especial versus escola comum), tendo como covariantes fatores como o nível escolar, a idade em que ocorreu a perda auditiva, e o grau dessa perda auditiva, dentre outros. Depois de examinar cada um dos 8.000 alunos durante 18 horas por aluno, a pesquisa revelou que, na educação infantil e nos primeiros 5 anos da educação fundamental, pelo menos, os alunos surdos se desenvolvem mais e melhor em escolas especiais para surdos (nas quais recebem instrução em Libras por professores sinalizadores fluentes e em meio a outros colegas surdos), ao passo que os alunos com deficiência auditiva se desenvolvem melhor em escolas comuns em regime de inclusão. A pesquisa concluiu que o melhor arranjo para crianças surdas consiste na articulação entre a educação principal em escolas para surdos durante o turno principal, e a educação complementar em escolas comuns em regime de inclusão em contra-turno complementar. A escola especial constitui o foro especializado em desenvolver competências cognitivas e linguísticas no alunado surdo; ao passo que a escola comum em regime de inclusão constitui o campo de provas para retroalimentar a educação especial, garantindo que ela se esforce em instalar no alunado as competências requeridas para que a inclusão seja realmente bem sucedida na prática, e não apenas uma carta de boas intenções. A importância da educação ministrada em Libras por professores sinalizadores fluentes em meio a colegas também surdos é tão maior quanto mais jovem a criança, e quanto maiores o grau da perda auditiva e a precocidade dessa perda auditiva. Como sua língua materna é a Libras, e não o Português, a criança surda não deve ser confundida com a criança com deficiência auditiva. Para que a educação seja humana e eficaz, é preciso que o idioma e a cultura da criança sejam respeitadas, e que a educação seja ministrada em sua língua materna (Libras) juntamente com o Português escrito, em meio a uma comunidade linguística sinalizadora. Os resultados da referida pesquisa encontram-se publicados em dezenas de fontes, algumas das quais encontram-se em anexo.

 

É imprescindível que as políticas públicas em Educação sejam fundamentadas em dados de pesquisa científica rigorosa e compreensiva, em nível nacional. A relatora Clélia Brandão Alvarenga Craveiro, do Conselho Nacional da Educação emitiu parecer CNE 13-2009 estabelecendo que alunos com deficiências sejam obrigatoriamente matriculados em escolas comuns. Contudo, como esse parecer não teve oportunidade ainda de levar em consideração o estado da arte da pesquisa científica a respeito do desenvolvimento de alunos com deficiência, rogamos que o Ministério da Educação não homologue o referido parecer, até que tenha tido a chance de examinar a mais completa e recente evidência científica a respeito.

 

Crianças com surdez profunda congênita ou pré-lingual, bem como crianças com deficiências múltiplas e com severos distúrbios múltiplos não podem e não devem ser privadas da educação especial necessária à sua condição especial, sob pena de fracassarem completamente não apenas na educação como, também, na vida. As escolas especiais foram criadas e nutridas e cultivadas pela própria comunidade ao longo das décadas por iniciativa nobre e altruísta da própria comunidade desamparada ante a omissão do poder público de outrora. Se o Ministério da Educação de hoje viesse a homologar o parecer do Conselho Nacional da Educação antes de examinar a evidência ciéntífica acerca das consequências dessa medida precipitada, ele estaria não apenas substituindo o sábio e nobre conselho da Ciência pelo volúvel conselho da Ideologia como também, o que é pior, atirando no lixo o patrimônio precioso da educação especial e, junto com ele, as vidas de milhões de crianças com quadros severos e múltiplos que têm nela a sua única esperança. Falas como toda criança é criança  e toda criança é especial roubam da criança especial o direito de ser vista como é: especial; e como todo aquele que já lidou com educação de crianças com surdez congênita profunda e com deficiências múltiplas e severas, a verdade é que algumas crianças são, mesmo, mais especiais do que as outras.

 

Confiante de que o Ministério da Educação, sensível à Educação e à Ciência, não se furtará de reexaminar os fatos antes de tomar uma decisão de implicações tão sérias como essa, ponho-me ao inteiro dispor do Ministério da Educação para fornecer detalhes ulteriores acerca dos achados mais relevantes, alguns dos quais encontram-se descritos nos arquivos anexos. Devido à frugalidade do espaço disponível, encontram-se anexados apenas alguns dos muitos relatórios dos achados.

 

Agradecendo sinceramente a atenção a esta solicitação, subscrevo-me,

 

Muito respeitosamente,

 

Fernando César Capovilla, PhD, Livre-Docente

Professor, Universidade de São Paulo

Coordenador Pandesb: Programa de Avaliação Nacional do Desenvolvimento Escolar do Surdo Brasileiro  (Capes-Inep)


 

Categoria pai: Seção - Notícias


No Brasil, 11,5% das crianças de oito e nove anos são
analfabetas, segundo o IBGE. O percentual supera a média nacional entre
adultos, de 10%. No Nordeste, o índice infantil vai a 23%. No Maranhão
atinge o pico nacional: 38%. Apesar de ter havido redução significativa
desde 1982, quando o índice nacional era de 47%, o ritmo da melhora vem
caindo. Se for mantido, o país não cumprirá a meta, estabelecida pelo
movimento Todos pela Educação, de ter 100% das crianças plenamente
alfabetizadas até 2022. A Provinha Brasil, do Ministério da Educação, que
também avalia o nível de alfabetização no segundo ano do ensino fundamental,
vem apresentando resultados igualmente dramáticos. Os dados reforçam a
necessidade de dar mais atenção à pré-escola. Entre as crianças que têm de
quatro a seis anos, 22% estão fora do pré -fonte certa de estímulos e
elementos pedagógicos de grande valia para o desenvolvimento intelectual
infantil.
As crianças mais pobres são as que estão mais afastadas da estrutura
escolar. Entre famílias cuja renda per capita é de mais de cinco salários
mínimos, apenas 5,5% das crianças de quatro a seis anos estão fora da
escola. Já entre as que têm renda de até um quarto de salário mínimo per
capita, o índice salta para 30%. A redução da idade mínima obrigatória
para ingresso no ensino fundamental -de cvlsete para seis anos- foi decerto
benéfica. O governo já discute com os municípios, principais responsáveis
pela educação infantil, *a possibilidade de tornar obrigatória também a
frequência na pré-escola.* *A universalização e a devida valorização dessa
etapa escolar são estratégicas para o país. *É preciso investir mais na
instalação e na qualificação da rede de pré-escolas e de creches. Do
contrário, o analfabetismo em crianças que já deveriam dominar o básico da
língua não será extinto num prazo visível.

Fonte: CVL

 

Categoria pai: Seção - Notícias

Homossexuais: 72 %

Necessidades especiais (mentais) 70,9%

Ciganos: 70,4%

Necessidades especiais ( físicas) : 61,8%

Índio: 61,6 %

Periferia ou favela: 61,4%

Pobre: 60,8%

Área rural: 56,4 %

Negro: 55,0 %

 

 

Categoria pai: Seção - Notícias

15 07 2009 Prazo para devolução termina, mas cargas de lixo tóxico permanecem no RS