Correio Braziliense
Artigo de Mozart Neves Ramos
Diretor-Executivo do Todos Pela Educação e membro do Conselho Nacional de Educação
Os instrumentos de avaliação aplicados pelo Ministério da Educação (MEC), como o Saeb e Prova Brasil, espelhados agora no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), vêm revelando a baixa qualidade do ensino público em nosso país, notadamente nas regiões mais pobres. Um dos fatores responsáveis pelo fraco desempenho é, sem dúvida, o baixo valor investido por alunoano. Enquanto países vizinhos, como Argentina, Chile e México, investem em média US$ 2 mil por aluno, o Brasil investe metade desse valor. Países da Organização do Comércio e Desenvolvimento Econômico (OCDE), com economias prósperas, investem em média sete vezes mais do que o Brasil. Assim, não é surpreendente que o Brasil esteja na última posição no ranking educacional da avaliação internacional, como retratado pelo Programa Internacional de Avaliação de Desempenho (Pisa).
Para contribuir na reversão do triste quadro da educação brasileira foi que surgiu, há um ano, fruto de aliança com a sociedade civil, o compromisso Todos Pela Educação. No seu ideário consta conjunto de cinco metas que, se cumpridas até 2022, ano do bicentenário da Independência do Brasil, o país poderá de fato comemorar a verdadeira independência.
Uma das metas, mais precisamente a quinta, reforça a tese da ampliação de recursos para a educação básica. Na sua concepção, além da boa gestão dos recursos, será preciso, em consonância com estudos da Unesco e do próprio Ministério da Educação, que o país invista 5% do PIB na etapa da formação educacional — o que equivale a colocar mais R$ 20 bilhões no orçamento da educação.
O primeiro passo para isso veio com a criação do Fundeb (um fundo de investimento para toda a educação básica). Apesar da importância, os recursos são ainda insuficientes para assegurar educação pública de qualidade para todos os brasileiros. No seu ápice de funcionamento, que ocorrerá daqui a três anos, o Fundeb aportará R$ 5 bilhões a mais, portanto longe dos R$ 20 bilhões desejáveis e necessários.
No início deste ano, o MEC lançou o Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE), com metas ambiciosas de qualidade refletidas no Ideb dos estados e municípios. A principal delas é que o Brasil chegue em 2022 com um Ideb igual ou superior a 6, de forma que comece a oferecer educação de qualidade compatível com a que hoje é oferecida pelos países da OCDE. Mas isso só será possível com financiamento adequado.
Medida importante nessa direção seria excluir a educação da DRU (Desvinculação dos Recursos da União). O que isso significa? O advento da DRU vem permitindo ao governo federal, desde 1995, a desvinculação de 20% dos impostos e contribuições federais, podendo assim formar espécie de fonte de recursos livre de destino predeterminado. Com isso, a educação perdeu, nos últimos 10 anos, cerca de R$ 43 bilhões, que poderiam ter sido utilizados para melhorar a qualidade do ensino público. Só este ano a educação deixará de receber algo em torno de R$ 7 bilhões.
Mas a situação pode se reverter. Para isso é necessário que o Congresso aprove a PEC (Proposta de Emenda Constitucional) nº 662007, apresentada pelo deputado Rogério Marinho, que prevê o fim paulatino da DRU sobre o orçamento do MEC. É importante afirmar que isso não vai tirar recursos do governo federal, apenas vai redirecioná-los para o leito de origem, ou seja, para a educação. Fazendo isso, e com a anuência do Poder Executivo, o Congresso dará demonstração inequívoca de que a educação começa a ser tratada com a prioridade que merece.
Priscilla Borges
O ensino médio necessita de mudanças. Essa é a constatação de professores, alunos e especialistas. O patinho feio da educação brasileira, sempre “esquecido” nas políticas públicas, precisa se renovar para não deixar a juventude brasileira à margem da sociedade. O mundo globalizado exige das escolas não só recursos tecnológicos, mas também novas formas de ensinar. Os computadores e a internet são fundamentais para dar novo fôlego às aulas e promover inclusão digital. Mas a escola precisa ir além. Precisa atender às demandas de uma juventude que chega ao ensino médio atrasada nos estudos, pressionada pela necessidade de entrar no mercado de trabalho e sem a universidade como prioridade.
Da equipe do Correio
Na escola, os estudantes não encontram o apoio de que precisam para superar as dificuldades de aprendizado que trouxeram na bagagem. Muitos não percebem a importância das aulas de física, química e matemática para o futuro. Como também não aprendem na escola uma profissão, há um contingente grande de jovens que desistem: ou não levam a sério os estudos ou abandonam a escola. Para suprir as carências e responder aos anseios da juventude, os currículos têm de se tornar mais atraentes; as aulas, menos monótonas e a escola, mais próxima da realidade.
O panorama do ensino médio no Brasil não é nada confortável. Os dados da Síntese de Indicadores Sociais 2006, divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mostram que a população de jovens com idade entre 15 e 17 anos é de 10,6 milhões. Destes, 8,7 milhões freqüentam a escola. Porém, apenas 45,3% deles estão na fase correta para a idade: o ensino médio. Na fase final da educação básica, estão matriculados ainda outros 2,8 milhões de brasileiros com idade entre 18 e 24 anos, que deveriam estar cursando ou concluindo um curso de graduação.
A situação do Distrito Federal também não é animadora. Dos 130 mil brasilienses de 15 a 17 anos, 113 mil estudam. Somente pouco mais da metade (51,4%) cursa a etapa correta para a idade, que é o ensino médio. De acordo com a Secretaria de Educação do DF, 38.625 estudantes matriculados nas turmas de ensino médio da rede pública estavam atrasados pelo menos dois anos em relação à idade ideal para cada série. Os números mais recentes sobre abandono e repetência, que são de 2005, revelam ainda que 15,55% dos matriculados à época largaram o colégio naquele ano.
O ministro da Educação, Fernando Haddad, reconheceu, na semana passada, que o ensino médio passa por uma grave crise que exige medidas urgentes para revertê-la. “A situação é crítica. A escola precisa ser mais interessante para os jovens. Falta uma conexão da educação formal com o mundo do trabalho”, opina. Ele aposta na criação de novas escolas técnicas para atender às demandas dos jovens. Até 2010, está prevista a criação de 214 novas instituições federais. Com a União assumindo parte dos alunos do ensino médio, Haddad acredita que os governos estaduais terão mais recursos para investir na qualidade.
Novos caminhos
Na opinião de especialistas, uma das alternativas para atrair os estudantes seria oferecer diferentes tipos de currículos para quem entra na etapa final da educação básica. O ensino médio diversificado foi tema de um seminário na Câmara dos Deputados na última segunda-feira. Especialistas de diversos países mostraram como a oferta de distintas modalidades de ensino contribuíram para manter os alunos mais tempo na escola, evitar que eles se envolvessem com a criminalidade e, com mão de obra mais qualificada, aumentar a produtividade do país.
“Em quase todos os países que compõem a Organização para Cooperação e desenvolvimento Econômico (OCDE), o término do ensino médio é pré-condição para o cidadão obter uma boa vida. A sociedade do conhecimento exige cada vez mais competências”, afirma Pasi Sahlberg, especialista da European Training Foundation. Entre as possibilidades citadas pelos especialistas estão a criação de currículos específicos a partir de disciplinas (humanidades, artes, saúde, por exemplo) ou enfoque (profissional e acadêmico).
O deputado Gastão Vieira (PMDB-MA), presidente da Comissão de Educação e Cultura da Câmara dos Deputados, responsável pela organização do evento, acredita que é importante conhecer as experiências de outros países para criar as próprias políticas. “Queremos obter subsídios para propor novas políticas, mas sem copiarmos modelos de ninguém”, destaca. Na opinião do deputado, é preciso investir na educação profissional. “Em todos os países, há alternativas para os diferentes perfis dos jovens. No Brasil, só há um único trajeto”, destaca o professor das Faculdades Pitágoras, Cláudio de Moura Castro.
Caroline Cardia Alarcão, 20, Janaína de Sousa Nonato, 18, Cristiane Caria de Aquino, 19, Jonathas Rodrigues, 19, e Luís Ricardo da Silva, 19, fazem parte do contingente de jovens que não conseguiram completar o ensino médio na idade correta. Caroline teve um filho e deixou de estudar para cuidar da criança. Janaína morava na área rural e a escola era muito distante. Cristiane reprovou a 6ª série, assim como Jonathas e Luís, que ainda repetiu de ano mais uma vez. Para eles, há muito o que mudar no ensino médio. Faltam estímulo dos professores, interesse de alunos, dinamismo às aulas, recursos e preparação para o mercado de trabalho.
Os cinco aprovam a idéia da oferta de qualificação profissional na escola. Assim que concluírem o ensino médio, eles farão um curso técnico para tentar um emprego. Jonathas é o único que pensa em disputar uma vaga no ensino superior, mas não abre mão de trabalhar. “É uma pressão muito grande”, confirma Janaína. Wélia Guimarães, diretora da Regional de Ensino de Planaltina, onde moram os jovens, defende a proposta. “Qualquer formação que dê mais oportunidades aos nossos alunos é importante. Os jovens estão cada vez mais exigentes e pedem processos mais dinâmicos”, avalia.