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03 10 2006 - TRIBUNA DO BRASIL

Rompendo com as tradições

Estudo revela que população local não está preocupada em repassar costumes

Uma cidade em que mais da metade da população veio de fora e não se preocupa em passar as tradições culturais do lugar de origem às novas gerações. Ainda que, na prática, reproduza no cotidiano pequenos hábitos trazidos da terra natal. Assim começa a ser definido o perfil sociológico do Recanto das Emas, por meio de uma pesquisa realizada por alunos da Faculdade da Terra de Brasília (FTB).

De acordo com as primeiras conclusões do estudo, os adultos do Recanto das Emas dizem não transmitir sua cultura natal aos filhos. Ao migrarem para o Distrito Federal, esses moradores abrem mão das características que traziam de seu estado para sentirem-se mais adaptados. Acabam por perder o sotaque e os costumes originais.

Iniciado em agosto, o levantamento – denominado Recanto em Cena: uma proposta de investigação – ainda está em fase embrionária e deve apresentar conclusões mais sólidas até 2008. Até agora, cem famílias foram acompanhadas. Dessas, cerca de 60% disseram não passar a identidade cultural às crianças e aos adolescentes, que correspondem a 38,30% da população do local.

Ana Caroline de Oliveira, aluna de Letras na FTB, é a monitora do projeto coordenado pelo professor Antônio Carlos Cosenza. Ela conta que visitou diversos desses pais que alegavam não ensinar aos filhos as tradições de sua terra. Na prática, no entanto, a estudante percebeu uma realidade diferente. Ainda que afirmassem não ter preocupação com tradições, as famílias utilizavam utensílios, roupas e alimentos típicos das regiões de onde vinham. “Eles transmitem seus costumes indiretamente e não percebem”, conclui Ana.

Sem sotaque

Os levantamentos já puderam também traçar um perfil migratório do Recanto das Emas – escolhido para a pesquisa por sediar um campus da FTB. Os dados demonstram que 50,54% dos moradores da cidade nasceram em outros pontos do DF e transferiram-se para o local há pouco tempo. Já os habitantes que vieram de cidades nordestinas, como Piauí, Bahia, Maranhão e Ceará, somam 23,31% do total. “Foi uma surpresa porque esperávamos que a maioria fosse do Nordeste”, afirma a monitora.

O professor Antônio Consenza acredita que os migrantes passam por um processo de descaracterização de seus regionalismos para se incluírem na nova comunidade. A principal característica a sofrer o rompimento é a linguagem. “A pesquisa tenta comprovar a hipótese de que as pessoas perdem seus sotaques e incorporam os do Centro-Oeste ou Sudeste, vistos na televisão”, diz Cosenza.

O projeto Recanto em cena utiliza como referência algumas pesquisas da lingüista Stella Maris Bortoni, da Universidade de Brasília (UnB). Stella fez diversos estudos que comprovaram a ausência de sotaque no DF e avalia a hipótese do professor Cosenza como plausível. “Realmente há um processo de acomodação da linguagem que, de acordo com as relações ou a idade, as pessoas acabam se adaptando às características culturais do local onde vão viver, mais rápida ou lentamente”, explica.

Além do estudo, o professor da FTB pretende criar um museu na faculdade que ressalte as características culturais das regiões representadas no Recanto.

 

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311006

A hora de eleger os professores

Correio Braziliense
Artigo de Célio da Cunha

Outubro pode ser considerado o mês dos professores. Nos dias 5 e 15 comemorou-se em nível internacional e nacional, respectivamente, o dia dessa categoria, ocasião em que se procura reconhecer o alcance social e pedagógico da profissão. Tradicionalmente, nessas datas, escrevem-se artigos, distribuem-se prêmios de inúmeros concursos e louva-se a dimensão idealista do magistério. Nada mais justo em se tratando de profissionais que têm a responsabilidade de educar, por longos anos, milhões e milhões de crianças e jovens de todo o mundo.

Porém, este ano, no Brasil, registra-se uma oportuna coincidência. O mês dos professores coincidiu com o das eleições. No dia primeiro foram eleitos centenas de parlamentares e muitos governadores e, no dia 29, já no segundo turno, outros governadores e o presidente do Brasil foram conhecidos. A coincidência leva-nos a oportuna e importante reflexão sobre a situação dos que carregam sobre os ombros a desafiante tarefa de educar o país.

Há poucos anos, o Laboratório de Psicologia do Trabalho da Universidade de Brasília, sob a coordenação de Wanderley Codo, realizou pesquisa de abrangência nacional sobre a saúde mental dos professores, cujo resultado revelou a síndrome de Burnout. Tal síndrome se manifesta no contexto da tensão permanente entre o compromisso de educar e as difíceis condições socioeconômicas dos mestres. O quadro não se alterou desde então e pode comprometer o futuro da educação.

Por seu lado, quem acompanhou os debates sucessórios teve a oportunidade de observar, repetidas vezes, o discurso da prioridade da educação na voz e vontade de muitos candidatos. Trata-se de discurso necessário e urgente. Nenhum país avança ou adquire credibilidade sem capital humano de boa qualidade. Se o Brasil ainda não logrou atingir uma etapa superior de desenvolvimento, em parte, deve-se à insuficiência de sua educação, em que pese o mérito de iniciativas inovadoras nos planos federal, estadual e municipal. Todavia, a generalização da educação de qualidade requer magistério profissionalizado, assim como qualificada infra-estrutura escolar, que, por sua vez, demanda consideráveis recursos adicionais. Ao acenar com a prioridade da educação, mas sem indicar o caminho ou os instrumentos, corre-se o risco de repetir o passado.

Assim, o discurso da prioridade da maioria dos que já foram eleitos só se converterá em realidade mediante forte decisão política, seguida da criação de mecanismos estáveis capazes de criar as condições para tirar do limbo os professores e convertê-los em atores centrais da revolução educativa que o país espera. A pesquisa citada indica forte compromisso dos professores que se frustra diante da falta de meios e de uma carreira desvalorizada. Discursos inconsistentes não convencem mais.

É provável que a importância dos professores ainda não tenha sido amplamente percebida pelos que, direta ou indiretamente, podem ajudar a colocar a educação como prioridade fundamental do Estado brasileiro. Nesse sentido, nunca será demais lembrar o pioneirismo do Ato Constitutivo da Unesco, que, no preâmbulo reconheceu, há mais de 60 anos que, nas mentes das pessoas está o segredo para a construção de personalidades lúcidas capazes de discernimento e equilíbrio. Esse processo se inicia na escola e, para o seu êxito, os professores são agentes centrais. Nunca se deve perder de vista que, num mundo globalizado que demanda mais e mais informações e conhecimentos, a educação escolarizada de qualidade tornou-se valor essencial e fundamental no contexto de todas as encruzilhadas do nosso tempo. Ela é ponto de partida e de chegada.

Essa evidência deve ter suficiente força para inspirar os novos governantes eleitos a não se esquecerem dos nossos mestres e dos mestres dos nossos filhos. Não por concessão política a uma categoria profissional, mas pensando nos que, educando as crianças e jovens do país, podem dar contribuição sem precedentes para o advento de cenários brasileiros mais justos e à altura das reivindicações de cidadania do nosso tempo. Essa talvez seja a melhor maneira de valorizar nossos professores, elegendo-os como protagonistas da renovação educacional brasileira.

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Brasil fica em 72º em ranking de educação

Folha de S.Paulo

O relatório anual da Unesco Educação Para Todos, divulgado ontem em Nova York, coloca o Brasil na 72ª posição num índice de desenvolvimento com 125 países que avalia o grau de cumprimento das metas traçadas na Conferência Mundial de Educação, no Senegal, em 2000. O país aparece em bloco intermediário, com índice considerado médio, uma posição atrás do Paraguai e uma à frente da Síria.
O que mais prejudica o desempenho do país no índice são as altas taxas de repetência e evasão no ensino fundamental, que refletem negativamente no cálculo da taxa de estudantes que iniciaram o ensino fundamental e conseguem chegar ao menos até o quinto ano.
Além da taxa de sobrevivência escolar até o quinto ano, o indicador compara também a escolarização no ensino fundamental, a taxa de analfabetismo adulto e a igualdade de gênero na educação.
O indicador varia de 0 a 1, sendo que, quanto mais próximo de 1, mais perto está o país de atingir as metas da Unesco. O índice total do Brasil (levando em conta todos os quatro indicadores) é de 0,905, considerado médio pela Unesco. Os países com melhor desempenho são Reino Unido, Eslovênia e Finlândia, todos com índice de 0,994. Das 125 nações comparadas, 47 apresentaram índice alto (acima de 0,950), 49 ficaram com os considerados médios e 29 tiveram índice baixo (abaixo de 0,850). O pior é Chade, com índice de 0,428.
O índice de acompanhamento das metas da Unesco é divulgado anualmente desde 2003. O Brasil apareceu pela primeira vez no relatório de 2005, divulgado em 2004. Na ocasião, o país apareceu com índice de 0,899. A posição no ranking não se alterou: continuou sendo a 72ª, com a única diferença que, naquele ano, foram 127 países comparados, em vez dos 125 do relatório deste ano.

Qualidade
Para o consultor em educação João Batista Araújo e Oliveira, o péssimo desempenho do país em questões de qualidade da educação não é novidade. Quando o indicador é de quantidade, o país costuma ir bem. Quando é qualidade, no entanto, o atraso fica evidente, diz.
De fato, essa não é a primeira pesquisa internacional a colocar o país em uma péssima colocação quando se avalia a qualidade. O Brasil é sempre um dos últimos colocados, por exemplo, nos exames do Pisa (sigla em inglês para Programa Internacional de Avaliação de Alunos), prova da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico que compara o desempenho de estudantes entre países.
O problema da repetência também já foi destacado num outro relatório da Unesco divulgado neste ano. Esse documento mostrou que o país tinha indicadores nesse quesito piores do que países extremamente pobres, como Camboja, Haiti ou Ruanda. Quanto maior a repetência, maior a probabilidade de evasão escolar.
O Brasil é citado no relatório divulgado ontem em Nova York como um dos países com sérios problemas de repetência, especialmente na primeira série do ensino fundamental. Segundo o Inep, órgão do MEC, 29% dos alunos repetiram a primeira série do ensino fundamental em 2003, e é justamente nessa série inicial em que o problema é mais grave.
O relatório, porém, faz menções positivas ao Brasil ao citar os programas de transferência de renda para os mais pobres, como o Bolsa Escola (criado no governo FHC) e o Bolsa Família (ampliação do Bolsa Escola feita no governo Lula).
O texto do relatório cita estudos brasileiros que mostram que esses programas tiveram efeito positivo na escolaridade de crianças mais pobres e na diminuição do trabalho infantil.

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Finalmente, uma língua negligenciada vai para o pedestal

Larry Rohter
em São Paulo

Mais pessoas falam português como língua materna do que francês, alemão, italiano ou japonês. Então talvez seja irritante para os 230 milhões de luso falantes que o resto do mundo freqüentemente considere sua língua menor e que seus romancistas, poetas e compositores passem despercebidos.

Um esforço está sendo feito aqui no maior país do mundo a falar português para corrigir essa situação. O Museu da Língua Portuguesa recentemente inaugurado em São Paulo, com apresentações multimídia e de tecnologia interativa, propõe que os luso-falantes e sua língua podem se beneficiar de um pouco de auto-afirmação e auto-propaganda.

Esperamos que este museu seja o primeiro passo para nos apresentar, exibir nossa cultura e sua importância para o mundo, disse Antonio Carlos Sartini, diretor do museu. Sempre faltou uma estratégia para promover a língua portuguesa, mas de agora em diante, as coisas podem tomar outro rumo.

O museu, que foi inaugurado em março, já se tornou o mais visitado no Brasil, atraindo crianças das escolas e acadêmicos, assim como turistas do Brasil e de países africanos de língua portuguesa.

Para manter a união e a harmonia lingüística, ele evita uma questão básica: se o domínio da língua por fim deve ser do país onde nasceu ou desta ex-colônia grande e barulhenta, onde o português é falado pelo maior número de pessoas.

George Bernard Shaw certa vez descreveu os EUA e o Reino Unido como dois países divididos por uma língua comum. O mesmo poderia ser dito sobre o Brasil, com seus 185 milhões de habitantes, e Portugal, com quase 11 milhões.

A questão não é o contraste entre o sotaque melífluo e musical do Brasil - português com açúcar, nas palavras do realista Eça de Queiroz, do século 19 - e o som cortado, quase gutural de Portugal. Há também diferenças marcadas de uso, que levaram a desentendimentos e alimentaram piadas.

Em Portugal, por exemplo, o termo que designa fila (de espera) é para os brasileiros uma gíria derrogatória para homossexual. A palavra portuguesa que designa terno de homem significa um fato ou informação no Brasil.

Alguns puristas em Portugal têm objeções para a versão colorida e cheia de gírias que é falada aqui e se espalha cada vez mais por meio das telenovelas brasileiras. Eles vêem tal informalidade como indigna da língua de Camões, o poeta do século 16 cujo épico de navegação Os Lusíadas é freqüentemente comparado às obras de Homero e Dante.

Certamente não é este meu entendimento, diz Maria Isabel Pires de Lima, ministra da cultura de Portugal, quando visitou o museu em agosto com Jose Sócrates Carvalho Pinto de Sousa, o primeiro-ministro de seu país. A língua é um instrumento vivo, que está sempre mudando, então não vejo esse fenômeno como pejorativo. Pelo contrário, as telenovelas são um instrumento importante para criar maior consciência da língua e da cultura portuguesa.

Em 1996, Brasil e Portugal uniram-se a cinco nações africanas -Angola, Cabo Verde, Guiné-bissau, Moçambique e São Tomé e Príncipe- para fundar a Comunidade de Países de Língua Portuguesa. O português recentemente foi designado língua oficial da Organização de União Africana, como resultado dos esforços da comunidade. Os líderes acham que mais pode ser feito e esperam que o Brasil guie o caminho.

Um de nossos objetivos é disseminar o português, para que tenha maior visibilidade em organizações internacionais, disse Jose Tadeu Soares, vice-diretor geral do grupo, em entrevista telefônica da sede em Lisboa.
Mas além do Brasil e de Portugal, alguns outros países só são independentes há 25 ou 30 anos e não têm os recursos para se projetarem no palco mundial como o Brasil.

Apesar de o grupo ter conferido recentemente o status de observador à China, onde a língua ainda é oficial em Macau, o português está sumindo na China e em lugares como Goa, Damao e Diu, na Índia, três outras antigos postos coloniais. Mas quando o Timor Leste obteve sua independência da Indonésia em 2002 e entrou para a comunidade, recebeu expressões de simpatia e apoio dos países luso-falantes.

Para os timorenses, o português é uma forma de afirmar sua identidade em relação à Indonésia e, nesse sentido, mesmo à Austrália, diz Luiz Fernando Valente, diretor do Departamento de Estudos Portugueses e Brasileiros da Universidade Brown, em entrevista telefônica de Providence, Rhode Island.

Mas, acrescentou, a aspiração de alguns luso-falantes de ver sua língua ganhar status oficial na ONU é provavelmente inalcançável. O português é uma língua global, falada em todos os continentes, disse ele, mas não é uma língua internacional, usada na diplomacia e nos negócios da mesma forma que o francês, e não sei se esse problema pode ser resolvido.

Sartini, o diretor do museu, disse que sua instituição planejava enviar exibições itinerantes ao exterior, para disseminar a língua e a cultura portuguesas. Idealmente, disse ele, tais mostras visitariam não sós países de língua portuguesa mas também outros como os EUA, que têm minorias que falam português.

O maior e mais antigo enclave português nos EUA fica perto de Providence, em Rhode Island, e Fall River e New Bedford, em Massachusetts. Há outros, como o Central Valley da Califórnia, em torno de Fresno, ou no sul da Flórida e Newark, N.J.

Em um festival literário aqui perto em agosto, porém, o autor anglo-paquistanes Tariq Ali disse, segundo a mídia local, que apenas três línguas sobreviverão com certeza até o final deste século: inglês, chinês e espanhol. Até José Saramago, romancista português e Prêmio Nobel que mora na Espanha, afligiu-se publicamente com a possibilidade do português ser superado pelo inglês e espanhol.

Os hispano-falantes algumas vezes brincam que o português é simplesmente um espanhol mal falado. Mas por causa do tamanho gigantesco do Brasil e de sua economia dinâmica, cidades como Buenos Aires e Santiago, em países vizinhos, agora estão cobertas de panfletos e cartazes oferecendo cursos de português.

Durante 850 anos, nossos vizinhos disseram que não havia futuro para o português, disse Soares, da comunidade, referindo-se à Espanha. Mas aqui estamos, ainda. A dinâmica da língua pode vir do Brasil, mas não tenho dúvidas de que o português como idioma continuará viável.

Tradução: Deborah Weinberg

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